São Paulo, terça-feira, 25 de junho de 2002

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Mercado consolida Protocolo de Kyoto na Europa

DO ENVIADO AO RIO

Mesmo que o Protocolo de Kyoto não entre em vigor até a Rio +10, o mercado mundial de carbono já está em operação na Europa. E mais: as empresas americanas também vão querer uma fatia dele, o que, cedo ou tarde, trará os EUA de volta ao acordo.
Esse quadro otimista não é de um membro de organização ambiental, mas de um economista: Jan Pronk, um holandês de 62 anos que se viciou em café de tanto passar madrugadas em claro negociando o texto do protocolo contra o efeito estufa.
Pronk, ministro do Ambiente e Desenvolvimento Urbano da Holanda, chefiava a conferência climática da ONU em março de 2001, quando George W. Bush se retirou de Kyoto por considerá-lo prejudicial à economia.
O protocolo prevê que os países industrializados reduzam em 5,2% suas emissões de gases-estufa (em relação aos níveis de 1990) até 2012. O principal desses gases é o dióxido de carbono, ou CO2, produto da queima de combustíveis fósseis -a base da economia energética mundial. Aderir ao acordo, segundo Bush, significaria perda de dinheiro e empregos.
A partir de então, Pronk liderou um esforço diplomático da União Européia que conseguiu salvar o pacto, no meio do ano.
Numa entrevista que só começou depois de um copo de café expresso, Pronk falou sobre o futuro do acordo climático e as vantagens que as empresas européias terão sobre as rivais americanas após a implementação.

Folha - Pode-se dar a implementação de Kyoto como certa agora que o Japão ratificou o acordo?
Jan Pronk -
Quase. Porque precisamos de 55% das emissões dos países industrializados, então, ainda falta um país grande, como a Rússia. Mas com a Rússia e a Ucrânia nós podemos implementar. Eu ficaria muito feliz se o Canadá também aderisse, porque ele foi parte de todo o processo de negociação. E tem outra coisa: a longo prazo, precisaremos dos EUA. E o Canadá é uma boa ponte.

Folha - Mas a implementação não deve ocorrer em Johannesburgo...
Pronk -
O Japão e a UE mantiveram sua palavra e ratificaram antes de 1º de junho. A Rússia disse que precisa de um pouco mais de tempo. Então eu acho que não vai dar em Johannesburgo.

Folha - Qual é o problema com a Rússia?
Pronk -
Talvez seja um problema burocrático. Pode ser uma razão econômica. Mas é uma razão de curto prazo. A longo prazo haverá muita demanda pelos créditos [de carbono, pelos quais um país que tenha cumprido suas metas vende a outros o direito de emitir gases de efeito estufa", por uma razão: eu acho que a União Européia tem sido muito otimista com seu potencial de redução doméstica de emissões de gás carbônico.

Folha - A Europa já está comercializando emissões?
Pronk -
Sim. Países já estão começando atividades em implementação conjunta [mecanismo do protocolo que prevê comércio de créditos-carbono entre países com metas a cumprir" e Mecanismo de Desenvolvimento Limpo [pelo qual países subdesenvolvidos vendem créditos". Já existe um esquema europeu em discussão para o comércio de emissões. Há também esquemas nacionais, que devem ser ajustados ao esquema europeu.

Folha - E quais são as penalidades para o não-cumprimento?
Pronk -
Esse é um ponto fraco. Eu acho que é só legalmente fraco, mas politicamente nem tanto, porque todos esses países levam a questão climática a sério. Claro, há um país ou outro que pode ter uma segunda intenção, mas é um tratado. Você não pode, unilateralmente, abandonar o tratado...

Folha - Mas Bush fez isso...
Pronk -
Não. Ele não assinou o protocolo. Ele assinou a Convenção do Clima, e não é a convenção que ele está abandonando.

Folha - Há quem diga que os EUA estão só esperando a UE adaptar sua indústria a Kyoto para usar a tecnologia transferida, de graça, por filiais das empresas americanas na Europa. Isso pode ocorrer?
Pronk -
Eu não acho que isso deva acontecer, porque há interesses diferentes nos EUA. Há empresas que se opõem totalmente ao tratado climático. Há empresas que estão muito interessadas nele e estão pressionando o governo americano a participar. Porque eles querem entrar no mercado de novas tecnologias de energia. Isso não é possível agora, e a UE ficará mais competitiva que os EUA. Então, eu não acredito nessa teoria. Haverá benefícios, mas muito mais custos para os EUA de entrar no mercado mais tarde.

Folha - Não é ingênuo pensar que eles não estão pensando nisso?
Pronk -
Parte do sistema industrial americano está muito preocupada. Mas as empresas de petróleo e carvão estão fazendo lobby contra. Muitas empresas de energia fazem lobby a favor. Até a Enron estava fazendo (risos). Será muito difícil para o presidente Bush não traduzir isso em ação política. (CA)


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