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Mercado consolida Protocolo de Kyoto na Europa
DO ENVIADO AO RIO
Mesmo que o Protocolo de
Kyoto não entre em vigor até a
Rio +10, o mercado mundial de
carbono já está em operação na
Europa. E mais: as empresas americanas também vão querer uma
fatia dele, o que, cedo ou tarde,
trará os EUA de volta ao acordo.
Esse quadro otimista não é de
um membro de organização ambiental, mas de um economista:
Jan Pronk, um holandês de 62
anos que se viciou em café de tanto passar madrugadas em claro
negociando o texto do protocolo
contra o efeito estufa.
Pronk, ministro do Ambiente e
Desenvolvimento Urbano da Holanda, chefiava a conferência climática da ONU em março de
2001, quando George W. Bush se
retirou de Kyoto por considerá-lo
prejudicial à economia.
O protocolo prevê que os países
industrializados reduzam em
5,2% suas emissões de gases-estufa (em relação aos níveis de 1990)
até 2012. O principal desses gases
é o dióxido de carbono, ou CO2,
produto da queima de combustíveis fósseis -a base da economia
energética mundial. Aderir ao
acordo, segundo Bush, significaria perda de dinheiro e empregos.
A partir de então, Pronk liderou
um esforço diplomático da União
Européia que conseguiu salvar o
pacto, no meio do ano.
Numa entrevista que só começou depois de um copo de café expresso, Pronk falou sobre o futuro
do acordo climático e as vantagens que as empresas européias
terão sobre as rivais americanas
após a implementação.
Folha - Pode-se dar a implementação de Kyoto como certa agora
que o Japão ratificou o acordo?
Jan Pronk - Quase. Porque precisamos de 55% das emissões dos
países industrializados, então,
ainda falta um país grande, como
a Rússia. Mas com a Rússia e a
Ucrânia nós podemos implementar. Eu ficaria muito feliz se o Canadá também aderisse, porque ele
foi parte de todo o processo de negociação. E tem outra coisa: a longo prazo, precisaremos dos EUA.
E o Canadá é uma boa ponte.
Folha - Mas a implementação não
deve ocorrer em Johannesburgo...
Pronk - O Japão e a UE mantiveram sua palavra e ratificaram antes de 1º de junho. A Rússia disse
que precisa de um pouco mais de
tempo. Então eu acho que não vai
dar em Johannesburgo.
Folha - Qual é o problema com a
Rússia?
Pronk - Talvez seja um problema
burocrático. Pode ser uma razão
econômica. Mas é uma razão de
curto prazo. A longo prazo haverá
muita demanda pelos créditos [de
carbono, pelos quais um país que
tenha cumprido suas metas vende
a outros o direito de emitir gases
de efeito estufa", por uma razão:
eu acho que a União Européia
tem sido muito otimista com seu
potencial de redução doméstica
de emissões de gás carbônico.
Folha - A Europa já está comercializando emissões?
Pronk - Sim. Países já estão começando atividades em implementação conjunta [mecanismo
do protocolo que prevê comércio
de créditos-carbono entre países
com metas a cumprir" e Mecanismo de Desenvolvimento Limpo
[pelo qual países subdesenvolvidos vendem créditos". Já existe
um esquema europeu em discussão para o comércio de emissões.
Há também esquemas nacionais,
que devem ser ajustados ao esquema europeu.
Folha - E quais são as penalidades
para o não-cumprimento?
Pronk - Esse é um ponto fraco.
Eu acho que é só legalmente fraco,
mas politicamente nem tanto,
porque todos esses países levam a
questão climática a sério. Claro,
há um país ou outro que pode ter
uma segunda intenção, mas é um
tratado. Você não pode, unilateralmente, abandonar o tratado...
Folha - Mas Bush fez isso...
Pronk - Não. Ele não assinou o
protocolo. Ele assinou a Convenção do Clima, e não é a convenção
que ele está abandonando.
Folha - Há quem diga que os EUA
estão só esperando a UE adaptar
sua indústria a Kyoto para usar a
tecnologia transferida, de graça,
por filiais das empresas americanas
na Europa. Isso pode ocorrer?
Pronk - Eu não acho que isso deva acontecer, porque há interesses
diferentes nos EUA. Há empresas
que se opõem totalmente ao tratado climático. Há empresas que estão muito interessadas nele e estão pressionando o governo americano a participar. Porque eles
querem entrar no mercado de novas tecnologias de energia. Isso
não é possível agora, e a UE ficará
mais competitiva que os EUA.
Então, eu não acredito nessa teoria. Haverá benefícios, mas muito
mais custos para os EUA de entrar
no mercado mais tarde.
Folha - Não é ingênuo pensar que
eles não estão pensando nisso?
Pronk - Parte do sistema industrial americano está muito preocupada. Mas as empresas de petróleo e carvão estão fazendo
lobby contra. Muitas empresas de
energia fazem lobby a favor. Até a
Enron estava fazendo (risos). Será
muito difícil para o presidente
Bush não traduzir isso em ação
política. (CA)
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