São Paulo, quinta-feira, 25 de outubro de 2001

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GUERRA BIOLÓGICA

Bacilos enviados por carta seriam da linhagem Ames, utilizada em programa americano de bioarmas

Revista diz que antraz usado em ataques saiu dos EUA

Reuters
Cultura de antraz no México


DA "NEW SCIENTIST"

Os casos continuam a aparecer, mas ainda não está claro quem é o responsável pelos ataques com a bactéria do antraz (carbúnculo), o Bacillus anthracis. As suspeitas se dirigem para o Iraque, mas a "New Scientist" pode revelar que os germes usados não provêm dali nem da antiga União Soviética.
Na realidade, trata-se da mesma cepa, ou linhagem, que os próprios EUA usaram para fabricar armas com antraz nos anos 60, ou similar a ela. Nem a cepa nem o modo físico pelo qual foi enviada são particularmente sofisticados, dizem especialistas em bioarmas.
Na semana passada, Tom Ridge, assessor de Segurança Doméstica do presidente dos EUA, afirmou que o antraz remetido à Flórida, à NBC e ao senador Tom Daschle era todo da mesma cepa. Um porta-voz do FBI na Flórida confirmou relatos correntes de que se tratava da cepa Ames.
Mas tem havido confusão sobre o que "Ames" quer dizer. O nome foi dado a uma linhagem isolada num laboratório do Departamento de Agricultura, em Ames, Estado de Iowa, nos anos 30.
Essa cepa, partilhada com microbiologistas do mundo inteiro, ainda afeta ocasionalmente gado do Oeste dos EUA. Publicações militares norte-americanas recentes também mencionam uma cepa "Ames" isolada de uma vaca em Iowa em 1980.
Cientistas que examinam o antraz dos ataques estão comparando seu DNA com o de coleções de cepas do mundo inteiro. Nessa coleção, o que se chama de "Ames" tem origens mais interessantes: saiu, em meados dos anos 80, de um freezer do Centro de Pesquisa e Microbiologia Aplicada, uma instalação de biodefesa britânica em Porton Down.
Porton Down havia adquirido a cepa do Instituto de Pesquisa Médica para Doenças Infecciosas do Exército dos EUA. É a linhagem que o país usou para produzir armas com antraz, dizem aqueles que reuniram a coleção.
Esse programa militar acabou em 1969. O antraz produzido em massa foi destruído, mas os EUA e seus aliados mantiveram amostras. Para ser identificado como "Ames", segundo esses cientistas, o antraz usado nos ataques deve ser ou a cepa militar norte-americana ou uma muito similar.
Para Ken Alibek, que ocupou o segundo posto no programa de guerra biológica da URSS, os autores dos ataques podem ter escolhido uma cepa de virulência reconhecida, mas difícil de rastrear. "Se eu fosse terrorista, decerto não usaria uma linhagem tida como proveniente de meu país."
Não seria difícil obter a Ames. "A coleção sul-africana tem centenas de cepas", diz Alibek. "Wouter Basson, antigo chefe do programa de guerra biológica da África do Sul, fez várias viagens à Líbia após a queda do regime do apartheid em 1994. Obviamente, a Ames também poderia ter sido obtida de alguém nos EUA."
Um experimento secreto realizado no ano passado (Projeto Bacchus) por funcionários do Departamento de Defesa dos EUA foi capaz de produzir um quilo de bactérias similares ao antraz. Elas foram reduzidas a partículas aspiráveis de pó, com uns poucos micrômetros (milésimos de milímetro) com máquinas vendidas livremente nos EUA.


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