São Paulo, domingo, 25 de novembro de 2001

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Periscópio

Tartarugas migradoras

José Reis
especial para a Folha

Há uns 30 anos os biológos marinhos procuram resolver o enigma da migração da tartaruga Caretta caretta das costas da Flórida e do Caribe. Só agora, porém, Kenneth Lohmann, da Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill, parece ter encontrado pelo menos parte da solução.
Esses quelônios, as tartarugas-cabeçudas ("loggerhead", em inglês), assim que nascem alta noite procuram o mar, talvez atraídos pelo reflexo luminoso da lua e das estrelas no oceano. Nadando através das ondas chegam à corrente do Golfo ("Gulf Stream") cujas águas percorrem no sentido norte até atingirem as proximidades da península Ibérica. Aí subitamente mudam de rumo numa encruzilhada que poderia levá-las para a Inglaterra, onde morreriam de frio. A esse caminho preferem o outro, que lhes permite atingir o mar dos Sargaços, onde permanecem de cinco a sete anos, alimentando-se abundantemente de invertebrados. Afinal, quase adultas, retornam às praias originais, onde fazem os seus ninhos.
Várias explicações surgiram quanto às pistas que orientam a navegação desses animais, muito se tendo falado no Sol e no olfato. Em 1985 descobriram-se no cérebro dessas tartarugas partículas de um minério magnético de ferro (magnetita), achado já feito em muitas outras espécies, desde bactérias até pombos e homens. Parece claro que o campo magnético terrestre atua sobre essas partículas e sobre a orientação dos seres vivos em que existem. Não se observou todavia ação sobre a navegação.
Lohmann decidiu submeter essa questão a observações ao vivo e em testes experimentais. Para isso construiu um vasto tanque cercado de bobinas que nele podem criar campos magnéticos. No centro do tanque fincou um dispositivo com braço movediço a cuja ponta livre atrelou os filhotes de tartaruga. À luz e no escuro observou o comportamento dos animaizinhos quando manipulava o campo magnético.
Das experiências e observações na natureza Lohmann concluiu que as tartarugas quando nascem são atraídas pela luz refletida no mar. Atingido esse, sua bússola cerebral fica ajustada, mas os animais se deixam guiar pelo movimento das ondas, que varam. Assim prosseguem até o alto-mar. Aí as ondas vêm em vários sentidos, e então as tartarugas apelam para sua bússola, que dá orientação muito precisa e pode registrar até pequenos ângulos de inclinação magnética, como o caminho que vai dos Sargaços às praias nativas.
Muitos biólogos marinhos aceitaram as conclusões de Lohmann, mas ao que informa Lisa Seachrist ("Science", vol. 264, pág. 661, 29/4/94), David Owens, da Texas A & M University, acha que o fator olfato não foi devidamente considerado. Ele não nega o valor de outras pistas, mas entende que todas elas devem ser encaradas em conjunto. Só o futuro dirá a última palavra. Lohmann pensa que, quando a questão estiver resolvida e todas as pistas conhecidas, talvez se consiga forçar as tartarugas, muitas de cujas espécies se acham ameaçadas, a escolher determinadas praias previamente examinadas quanto a sua capacidade de melhor proteger os quelônios. Lohmann publicou seu trabalho na "Science" (vol. 294, pág 364, 12/10/2001).


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