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AIDS
Descoberta de mecanismo de defesa em infectados que não manifestam doença pode conduzir a um novo tipo de vacina
Anticorpo raro dá pistas para atacar HIV
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Um raro anticorpo retirado de
pacientes infectados com o vírus
HIV, mas que não contraíram
Aids, teve seu mecanismo de ação
e sua estrutura explicados por
uma equipe internacional de pesquisadores. Por ser capaz de neutralizar o vírus causador da doença, o anticorpo 2G12 é agora um
forte candidato a servir de base a
uma vacina eficaz contra a Aids.
Anticorpos são proteínas produzidas pelo organismo para a
defesa contra infecções. O sistema
de defesa reconhece o agente infectante, chamado de antígeno.
Vacinas são criadas a partir de antígenos, para forçar o organismo a
reconhecer o agente, produzir anticorpos e eliminar o invasor em
caso de infecção.
O 2G12 pode servir de molde
para a produção de um antígeno
que faça o organismo reagir, produzindo o anticorpo para combater o vírus HIV. O vírus da Aids
ataca justamente as células do sistema de defesa, chamadas linfócitos T CD4+, que coordenam o
contra-ataque por anticorpos e
células T "matadoras". A pessoa
infectada pelo HIV produz anticorpos, mas eles não chegam a ser
do tipo neutralizador do vírus.
O anticorpo neutralizador 2G12
foi isolado há uma década de um
paciente infectado pelo HIV, mas
que não desenvolvia a doença. O
isolamento foi obtido por Hermann Katinger, da Universidade
de Agricultura, Viena (Áustria).
Katinger é um dos 16 pesquisadores dos EUA e Europa que assinam o artigo científico publicado
na edição de hoje da revista científica norte-americana "Science"
(www.sciencemag.com).
Os pesquisadores descobriram
que a eficácia do 2G12 está na sua
conformação pouco comum. Anticorpos têm a forma de uma letra
"Y". Nos braços do "Y" fica a capacidade de reconhecer um antígeno e se grudar a ele.
O vírus HIV evita ser reconhecido e atacado pelos anticorpos
porque a sua capa externa de proteína está coberta por açúcares
que o organismo não interpreta
como os de um agente invasor.
O anticorpo neutralizador 2G12
consegue atacar o HIV porque é
capaz de reconhecer que, apesar
de os açúcares serem iguais aos
disponíveis no organismo, a forma como estão arranjados é diferente. Esse reconhecimento é possível graças aos "braços" do anticorpo, que se entrelaçam e criam
uma superfície mais extensa para
se ligarem aos açúcares.
"Nunca se viu nada igual", diz
um dos autores do estudo, Ian
Wilson, do Instituto de Pesquisa
Scripps, na Califórnia, EUA, sobre
a rara configuração do anticorpo.
Espera-se que a descoberta permita aos cientistas projetar e sintetizar anticorpos específicos e
com maior capacidade de reconhecimento dos seus alvos.
Coordenação internacional
Na mesma edição da "Science",
alguns dos principais nomes da
ciência mundial envolvidos no
combate à Aids pediram a criação
de uma rede de centros de pesquisa de vacinas contra a doença.
Eles alertam que, no atual ritmo
da epidemia, 70 milhões de pessoas terão morrido em 2020, e o
desenvolvimento de uma vacina
preventiva eficaz é essencial para
reverter esse quadro.
São 24 autores de EUA, França,
Reino Unido, África do Sul, Índia,
Suíça e China, incluindo dois ganhadores do prêmio Nobel, David Baltimore e Harold Varmus.
Os signatários propõem o estabelecimento de seis a dez centros
de desenvolvimento de vacina.
Cada um deles sistematicamente
criaria produtos e faria os testes
da fase pré-clínica dos protótipos
de vacinas.
"Um empreendimento global e
bem coordenado necessário para
tocar o esforço científico não existe e precisa ser criado", dizem os
autores. O custo de criar vacinas é
bem mais alto do que o de criar
um medicamento, por isso poucas empresas farmacêuticas têm
apostado nelas.
Os autores do artigo defendem
que um novo tipo de parceria entre o setor público e o privado
precisa ser criado, para levar
adiante o esforço de criação de
uma vacina.
A coordenação global também
permitiria evitar a duplicação de
esforços, algo que tem acontecido, apesar do número limitado de
vacinas em testes.
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