São Paulo, terça-feira, 27 de agosto de 2002

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Efeito estufa favorece o cólera, diz pesquisa

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Um estudo sobre a incidência do cólera em Bangladesh demonstrou pela primeira vez que a intensificação do aquecimento do planeta está alterando o comportamento das doenças que afetam o homem.
Mercedes Pascual, da Universidade de Michigan (EUA), e colegas queriam descobrir se havia correlação entre o fenômeno conhecido como El Niño e variações na incidência do cólera em Bangladesh, onde é endêmico.
O El Niño ou Oscilação Sul é um fenômeno cíclico de interação da atmosfera com o oceano, no qual ocorrem o aumento da temperatura da superfície do mar e alterações nos ventos no oceano Pacífico equatorial, principalmente ao longo da costa peruana. De 1900 a 1997 ocorreram 28 casos de El Niño. O fenômeno afeta o clima em uma vasta área do globo.
A equipe de Pascual usou dados de incidência de cólera de 1893 a 1940 e de 1980 a 2001. Os dados do começo do século passado não tiveram correlação com o El Niño. Já no período mais recente se percebeu um elo entre o fenômeno climático e a doença. O aquecimento do mar é favorável à multiplicação da bactéria causadora da doença, Vibrio cholerae.
A associação entre calor e doença pode parecer natural, mas não é tão simples assim. "O problema é que mudanças no clima ocorrem ao longo de períodos muito longos, e isso torna difícil obter evidências das mudanças nos padrões da doença", diz Pascual.
"Nós comparamos a variabilidade da doença ano a ano e como ela se relaciona com a variabilidade ano a ano do índice de El Niño. Vimos que o elo entre a variabilidade da doença e a do clima se tonou mais evidente nas últimas duas décadas", afirma a pesquisadora. Ela interpreta esse fato como resultado de mudanças provocadas no El Niño pelo aquecimento do planeta. Desde os anos 50, a temperatura da superfície da Terra aumentou em média 0,6C.
A pesquisa, publicada na última edição da revista científica americana "PNAS" (www.pnas.org), "representa a primeira evidência de que as tendências de aquecimento ao longo do último século estão afetando a doença humana", segundo comentou, na mesma revista, Jonathan Patz, da Universidade Johns Hopkins.
O aumento da temperatura do planeta, associado à maior variabilidade, tornam mais difícil controlar o cólera em um cenário de mudança climática, diz Patz. Mas, para ele, o estudo também tem seu lado otimista, ao melhorar a capacidade de previsão quanto ao risco da doença na região.


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