UOL


São Paulo, quarta-feira, 27 de agosto de 2003

Próximo Texto | Índice

COLUMBIA

Relatório final de comissão independente aponta displicência e cortes de verba como culpados pela perda da nave

Cultura da Nasa vitimou ônibus espacial

Pablo Martinez Monsivais/Associated Press
O almirante Harold Gehman concede entrevista em Washington


FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

Falta de rigor em procedimentos de segurança, terceirização de serviços, cortes de verba e pessoal e uma "cultura de autoproteção excessiva" dentro da Nasa foram apontados como os principais fatores que levaram à desintegração do ônibus espacial Columbia no início deste ano.
Essa é a principal conclusão da comissão especial que investigou o acidente, que matou todos os sete tripulantes da nave sobre o Texas a 16 minutos da hora prevista para a aterrissagem, no dia 1º de fevereiro passado.
A causa física para o desastre, segundo a comissão, ocorreu 16 dias antes da desintegração da nave, que participava de sua 28ª missão -a 113ª do programa de ônibus espaciais americanos. No momento da decolagem, com a nave já a 20 km do solo e subindo a 2.475 km por hora, um pedaço de espuma responsável pelo isolamento térmico se desprendeu do tanque principal de combustível do ônibus espacial.
Ao se soltar, a espuma se espatifou a mais de 800 km/h contra o bordo de ataque (porção frontal) da asa esquerda do ônibus espacial, abrindo um pequeno buraco. O incidente chegou a ser detectado pelo pessoal em terra, por meio de imagens fotográficas e em vídeo, no dia seguinte.
Mesmo assim, a missão continuou por 16 dias sem que a Nasa (Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço, na sigla em inglês) tomasse providência alguma. O relatório da comissão independente, que levou sete meses para ser concluído pelos seus 13 membros, afirma que os engenheiros da Nasa "tinham uma idéia clara" de que o Columbia poderia ter sido "seriamente danificado" no seu lançamento.

Falta de ação
O texto diz ainda que a Nasa tinha conhecimento "dos próximos passos que poderiam ter sido tomados" e que poderia ter ao menos tentado reparar o dano na asa do ônibus espacial, que acabou por originar o processo de desintegração da nave.
Cerca de 4,5 minutos depois de iniciar seu procedimento final de descida à Terra, depois de viajar mais de 9 milhões de quilômetros girando em torno do planeta, o Columbia começou a sofrer as consequências causadas pelo pequeno buraco aberto em sua asa 16 dias antes.
Em um ponto a 121,9 km de altitude conhecido como interface de reentrada, os efeitos da atmosfera terrestre começaram a ser sentidos pela nave.
Com o ônibus espacial viajando a mais de 15.000 km/h, o atrito fez entrar pelo buraco na asa plasma (gás superaquecido) a temperaturas superiores a 2.700C, ampliando o rombo na beirada da asa e acabando por destruir toda a sua estrutura.
Os mais de 84 mil pedaços da Columbia (38% da nave) resgatados sobre os Estados do Texas e da Louisiana (sudoeste dos EUA) nos dias seguintes ao acidente revelam que vários instrumentos trabalharam freneticamente para manter o ônibus espacial em sua rota correta, até milésimos de segundo antes de perder totalmente o controle e se desintegrar.
"O acidente não foi um evento aleatório, mas enraizado em certo grau na cultura da Nasa", afirma o almirante Harold Gehman, chefe da equipe que concluiu o relatório de 248 páginas.
"Estamos convencidos de que as formas de gerenciamento prático envolvidas na operação do ônibus espacial tiveram a mesma importância, para as causas do acidente, que o impacto da espuma que se desprendeu", diz.
Para John Logsdon, professor da Universidade George Washington e um dos membros da comissão, a Nasa opera hoje "sob estresse e tensão causados por restrições orçamentárias que levaram a cortes de mais de 40% em termos orçamentários e de pessoal durante os anos 90".
"Várias das responsabilidades inerentes à Nasa estão hoje na mão de empresas contratadas, todas trabalhando com metas que não levam em conta todos os procedimentos de segurança", afirma Logsdon.
As duas maiores empresas envolvidas no projeto de ônibus espaciais são a Boeing e a Lockheed Martin, que em 1996 formaram o consórcio United Space Alliance para conduzir o dia-a-dia das operações com a Nasa.
Apesar das críticas, a comissão se mostrou pessimista com os próximos passos da Nasa no sentido de sanar os problemas que poderiam levar a novos acidentes. Para a comissão, a Nasa tem um "histórico de ignorar recomendações externas" e de "realizar alterações em projetos que se atrofiam com o tempo".

Novo rumo
Segundo o relatório, é preciso que a Nasa defina seus planos para o futuro e conduza seus projetos em harmonia com esses objetivos. O administrador da Nasa, Sean O'Keefe, declarou que o relatório servirá como "um mapa" para mudanças na agência. E o presidente George W. Bush, em comunicado, declarou: "Nossa jornada ao espaço vai continuar. O trabalho da tripulação do Columbia e dos heróicos exploradores que viajaram antes deles irá continuar".


Próximo Texto: VLS-1: Viegas quer acelerar programa brasileiro
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.