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BIOÉTICA
Reunião fechada nos EUA examina idéia de testar células-tronco humanas em camundongo, produzindo quimera
Grupo debate híbrido de homem e roedor
NICHOLAS WADE
DO "THE NEW YORK TIMES"
Um grupo de biólogos americanos e canadenses está debatendo
se recomenda a realização de experimentos com células-tronco
(capazes de se transformar em
outros tipos de célula) que envolveriam a criação de híbridos de
humanos com camundongos.
O objetivo seria testar diferentes
linhagens de célula-tronco embrionária humana quanto à qualidade e ao potencial de utilidade
no tratamento de doenças específicas. A melhor maneira de fazê-lo, argumentam alguns biólogos,
é ver como as células se comportam em um animal vivo. Por razões éticas, o teste não pode ser
realizado com pessoas.
Caso células-tronco humanas
sejam testadas dessa maneira em
camundongos, todo animal nascido do experimento seria uma
quimera (organismo em que se
misturam células de dois tipos),
com células humanas distribuídas por todo o corpo.
Embora seja provável que a
criatura se tornasse um camundongo com umas poucas células
humanas obedecendo a regras do
roedor, o resultado de tal experimento não pode ser previsto. Um
camundongo com o cérebro
composto só de células humanas
seria provavelmente algo perturbador para muita gente, assim como um que gerasse espermatozóides ou óvulos humanos.
Resultados inesperados
Irving Weissman, especialista
em células-tronco da Universidade Stanford, disse que fabricar camundongos com células humanas poderia ser "um experimento
de importância enorme". Realizado sem cuidado, poderia levar a
resultados que seriam "horríveis
demais para contemplar".
Weissman mencionou como
exemplo extremo a possibilidade
de que um camundongo produtor de espermatozóides humanos
fosse acidentalmente posto para
cruzar com uma fêmea produtora
de óvulos humanos.
Pelo menos dois biólogos do
grupo que discute o experimento
acreditam que ele é prematuro ou
contrário à ética, e que poderia
animar as autoridades a impor limites adicionais para a pesquisa
com células-tronco, ou bani-la.
As células-tronco são como a argila de todos os tecidos do corpo e
suscitam a expectativa de um material polivalente para atacar
doenças degenerativas da idade
avançada, como mal de Parkinson, câncer e males cardíacos.
Outros cientistas dizem que esses experimentos seriam de grande valia e poderiam ser conduzidos com células-tronco humanas
modificadas para se tornar incapazes de produzir células do cérebro ou reprodutivas. Reconhecem, porém, que mesmo uma experiência programada com tais
precauções precisaria primeiro
ser submetida a uma revisão científica e ao debate público.
A proposta do experimento surgiu de uma reunião ocorrida no
último dia 13 na Academia de
Ciências de Nova York. Foi organizada pela academia e pela Universidade Rockefeller, sob a direção de Ali Brivanlou.
Brivanlou convidou oito autoridades em células-tronco e, como
observadores, dois editores científicos de publicações especializadas, além de James Battey, diretor
do Instituto Nacional de Surdez e
coordenador do grupo de trabalho sobre células-tronco dos Institutos Nacionais de Saúde dos
EUA. O encontro não deveria se
tornar público, disse Brivanlou, e
em dado momento os observadores, incluindo Battey, foram convidados a se retirar da sala.
Um dos editores da revista escreveu sobre o encontro na edição
passada da revista "Nature", dizendo que Battey "criticou os participantes pelo que chamou de sigilo excessivo". Battey não respondeu a ligações para sua sala.
O propósito do encontro, disse
Brivanlou anteontem, foi discutir
a adoção de padrões de qualidade
para diversas novas linhagens humanas de célula-tronco em desenvolvimento mundo afora.
No teste que discutiram, células-tronco embrionárias humanas seriam injetadas em um embrião jovem de camundongo,
uma minúscula bola de células
chamada blastocisto. Os cientistas
veriam, então, se as células-tronco humanas apareceriam em todos os tecidos do camundongo.
Essa capacidade, conhecida com
pluripotencialidade, é a marca registrada de uma verdadeira célula-tronco embrionária.
A injeção no blastocisto de um
outro camundongo é o teste-padrão para células-tronco embrionárias de roedores, que, como as
similares humanas, são derivadas
de um pequeno conjunto de células multiuso poucos dias depois
de o óvulo fertilizado ter começado a se dividir.
Ninguém sabe ainda se células-tronco embrionárias humanas
sobreviveriam num blastocisto de
camundongo. Mas, se isso acontecesse e elas aparecessem em todos os tecidos do animal, seria um
teste útil para várias das supostas
linhagens de célula-tronco embrionária humana que vêm sendo
desenvolvidas, disse Brivanlou.
Janet Rossant, do Hospital
Mount Sinai de Toronto (Canadá), que participou do encontro,
disse que não considerava o teste
necessário. Ela acredita que, se as
células humanas injetadas contribuírem para os tecidos do camundongo, "será algo que a maioria
das pessoas vai achar inaceitável".
Weissman, que não esteve presente à reunião, disse que o experimento poderia ajudar a observar o comportamento de células
humanas com doenças genéticas.
Estudar a maneira como as células doentes se desenvolvem num
camundongo poderia dar novas
perspectivas de tratamento.
Ele disse que um procedimento
desses precisaria ser cuidadosamente examinado por um órgão
como a Academia Nacional de
Ciências dos EUA. "Você deve assegurar a si mesmo e ao público
que isso é ético. Os cientistas não
devem decidir sozinhos."
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