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São Paulo, quinta-feira, 31 de julho de 2003

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AMBIENTE

Substância sintetizada por pesquisadores dos EUA pode apontar novos rumos para indústria química mais limpa

Molécula faz reação sem resíduos tóxicos

MARCUS VINICIUS MARINHO
DA REPORTAGEM LOCAL

A chamada "química verde", que busca tratar os processos químicos de uma forma mais ambientalmente correta, ganhou um novo aliado: a fabricação de um catalisador (acelerador de reações) que se separa sozinho dos produtos formados ao fim de uma reação sem solventes.
Transformações químicas sem solvente são uma espécie de pedra filosofal da química. O uso desses líquidos, usados para dissolver outras substâncias, é banalizado na química convencional e costuma gerar dejetos industriais tóxicos e de difícil tratamento.
Um dos grandes obstáculos para a implementação da química sem solventes é a série de restrições que a ausência dessas substâncias traz ao uso de catalisadores, compostos imprescindíveis em inúmeros processos industriais. Na maioria das vezes, o solvente é necessário, pois o catalisador fica nele dissolvido para poder agir e acelerar a reação.
Pesquisadores do Laboratório Nacional Brookhaven, nos EUA, romperam essa barreira e abriram as portas da química verde para os catalisadores: fizeram, sem a ação de solventes e em meio líquido, uma reação importante nos meios industriais, com um catalisador desenhado de maneira a acelerar a formação dos produtos e se separar sozinho no fim da reação, depositando-se no fundo do frasco. O catalisador também é "reciclável", podendo ser utilizado várias vezes.
"Nosso objetivo é eliminar qualquer substância que possa vir a se tornar um dejeto e poluir o ambiente. Por essa razão, é importante eliminar o solvente e reciclar o catalisador para uso contínuo", disse à Folha o químico americano Morris Bullock, 46, um dos autores do estudo.
Bullock vê ainda outros usos para seu catalisador. "Isso tem, além das implicações ecológicas, importância econômica para as indústrias, que gastarão menos dinheiro com substâncias e processos de separação. Mas nosso foco principal sempre foi a questão ecológica", conta.

Separação
O catalisador que a equipe de Bullock produziu e estudou, uma substância à base de tungstênio e compostos orgânicos, serviu para acelerar a síntese de substâncias chamadas alcoxissilanos, que têm grande importância na indústria de materiais cerâmicos e na pesquisa em química orgânica. "Escolhemos o tungstênio pois ele, além de ser bastante eficaz, é mais barato que outros catalisadores", explica o cientista.
A reação funciona da seguinte maneira: em um tubo de ensaio, o catalisador, sólido, é adicionado aos dois reagentes, substâncias líquidas, e se dissolve na mistura.
Na medida em que a reação é acelerada, os reagentes são consumidos e o produto rapidamente se forma, vai ficando mais difícil dissolver o catalisador na mistura, já que ele foi projetado especificamente para ser solúvel nos reagentes e insolúvel nos produtos.
No fim da reação, já que não há mais reagente, o catalisador volta a ser sólido e se separa do líquido, descendo até o fundo do tubo. "A reação acontece até o final, porque o catalisador age bem até quando há muito pouco dele dissolvido na mistura", diz Bullock.
No fundo do tubo de ensaio, um sólido como o catalisador, que, segundo o pesquisador é um pouco pastoso, pode facilmente ser separado dos produtos da reação e ser novamente utilizado.

Extensão da descoberta
Embora a reação realizada pela equipe americana seja um caso bem específico, a descoberta pode eventualmente ser estendida a muitas outras reações químicas.
"Fazendo pequenas modificações em nosso catalisador, poderemos abarcar outras reações nessa visão de química limpa", afirma Bullock.
De qualquer maneira, ao aproximar os catalisadores, importantes agentes de processos químicos, de uma concepção mais ecológica, o cientista acredita ter aberto uma nova trilha no desenvolvimento da química verde.
"Esperamos encorajar as indústrias e outros grupos de pesquisa a trabalhar com química limpa por meio do fornecimento de mais ferramentas. Espero, também, que outros no mundo se espelhem no que fizemos e aumentem o conhecimento nessa área tão carente de desenvolvimento", conclui o cientista.
O estudo foi publicado na edição de hoje da revista científica "Nature" (www.nature.com).


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