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São Paulo, sexta-feira, 31 de outubro de 2003

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CLIMA

Microrganismo acabou com superglaciação

REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Pesquisadores nos Estados Unidos dizem ter descoberto como as piores glaciações da história da Terra, que colocaram até o Equador debaixo de neve entre 1 bilhão e 540 milhões de anos atrás, chegaram ao fim. Quem pôs fim a esses ciclos foram microrganismos marinhos, capazes de devolver à atmosfera o gás carbônico e fazer o planeta esquentar de novo.
A teoria esboçada pelo geólogo britânico Andy Ridgwell e seus colegas da Universidade da Califórnia em Riverside tem como participantes principais os minúsculos cocolitoforídeos e foraminíferos, criaturas de uma só célula que vivem em mar aberto. Seu "corpo" unicelular é protegido por intrincadas conchas de CaCO3, ou carbonato de cálcio.
Acontece que nenhum desses micróbios de nome complicado existia quando o planeta passou pela fase conhecida como "Snowball Earth", ou "Terra Bola-de-Neve". Ninguém ainda sabe muito bem qual foi o gatilho do resfriamento global, mas o pesquisador conseguiu, por meio de dados climáticos e modelos de computador, explicar como ele se manteve e como deve ter acabado.
Depois que um primeiro resfriamento aconteceu, sequestrando parte das águas dos oceanos em geleiras, o nível do mar caiu brutalmente. Antes disso, o pH (grau de acidez) dos oceanos era regulado pela formação de CaCO3 nas águas rasas. O carbonato se forma a partir do gás carbônico da atmosfera, o qual, por sua vez, causa o efeito estufa, responsável por manter a Terra quente.
Acontece que, com o desaparecimento das águas rasas, esse mineral passou a se dissolver mais na água, que ficou mais ácida (ele precisa de um ambiente ácido para se dissolver). Para ajudar, ele fica ainda mais solúvel em águas profundas, por causa da pressão. E sua formação passou a retirar mais gás carbônico da atmosfera, esfriando o planeta. "O sistema nesse mundo antigo era muito instável", diz Ridgwell.
A coisa mudou de figura, no entanto, quanto os microrganismos de concha evoluíram. Eles passaram a sequestrar o carbonato de cálcio para montar seu esqueleto calcário e reequilibraram o pH do oceano, de forma que o gás carbônico pôde voltar à atmosfera e reter outra vez o calor do Sol na Terra. Era o fim da bola-de-neve.
"O mais interessante é que esses organismos não fizeram isso "de propósito", mas apenas para se proteger. Mesmo assim, isso mudou todo o rumo da evolução na Terra", diz Ridgwell, para quem o episódio é prova do potencial da vida para alterar o planeta.


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