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DIREITOS HUMANOS
Na pesquisa do Datafolha, 72% se manifestaram contra a prática; em relação a 1997, apoio aumentou
24% dos paulistanos admitem a tortura
LUIZ CAVERSAN
GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Quase um quarto dos paulistanos -ou exatos 24%- admite a
prática de tortura para que pessoas suspeitas confessem crimes.
É o que revela pesquisa do Datafolha realizada na capital com
4.509 pessoas maiores de 16 anos,
para quem a tortura física deve ser
sempre utilizada pela polícia para
obter a confissão de culpa por
parte de suspeitos (7% do total)
ou deve ser aplicada às vezes, dependendo da situação (17%).
A maioria absoluta dos paulistanos, no entanto, manifestou-se
contra a prática da tortura como
método de interrogatório. Aqueles que assim se posicionaram somam 72% das pessoas ouvidas
pelo Datafolha entre os dias 19 de
novembro e 3 de dezembro.
Os números, recolhidos em todas as regiões da cidade, demonstram que, na comparação com
pesquisa anterior realizada em
1997, aumentou o apoio dos paulistanos a essa prática, classificada
pela legislação em vigor como crime hediondo e que expõe seu praticante a penas de prisão de dois a
oito anos, sem direito a fiança
-no caso de o torturador ser funcionário público e o torturado
morrer, a pena pode ir a 21 anos.
Há seis anos, a quantidade de
pessoas para quem suspeitos
nunca deveriam ser torturados
chegava a 78% do total de entrevistados pelo Datafolha, ao passo
que 15% diziam que a tortura poderia ser utilizada às vezes, e 5%,
sempre que se quisesse obter a
confissão de um crime.
Esses números só encontram
paralelo em levantamento realizado há quase dez anos, quando
27% dos paulistanos admitiam algum tipo de tortura e 71% se manifestaram contra.
Contexto de violência
Os dados revelados pelo último
levantamento do instituto emergem de um contexto em que há
grande preocupação da população da cidade de São Paulo com a
violência e uma tendência de
apoio ao recrudescimento das punições aos atos de criminosos.
Números extraídos desse levantamento e publicados pela Folha
em caderno especial sobre os paulistanos no último dia 25, dão
conta de que a violência é a primeira idéia que vem à cabeça do
morador de São Paulo quando ele
pensa em sua cidade.
A falta de segurança foi também
apontada como a principal desvantagem de viver na capital.
Outros dois pontos abordados
pela pesquisa referiam-se à punição de criminosos: aumentou o
número de paulistanos que são
favoráveis à adoção da pena de
morte (59%), assim como cresceu
o apoio à eventual instituição da
prisão perpétua no país (81%).
O Datafolha dividiu a cidade em
19 regiões de acordo com a proximidade e afinidades socioeconômicas dos bairros. Dessa forma,
pode-se afirmar que a região em
que é maior o apoio da população
à prática da tortura em interrogatórios é a que compreende os
bairros Ipiranga, Vila Prudente e
Sacomã: nada menos que 31% dos
entrevistados são favoráveis ao
suplício físico sempre (9%) ou em
certas situações (22%).
Esses bairros, relativamente
próximos do centro e localizados
no sudeste do município, abrigam moradores de classe média
de perfil conservador. A criminalidade na área é baixa, se comparada a outras regiões da cidade,
com exceção das proximidades
da favela Heliópolis, no Sacomã.
Dados referentes ao ano de 2000
dão conta, por exemplo, que oito
moradores do Ipiranga, na faixa
de 15 a 24 anos, foram vítimas de
homicídio naquele ano.
É na problemática região de Sapopemba/São Mateus, na zona
leste, que se encontra o maior número de entrevistados que
apóiam a prática de tortura pela
polícia -10% têm essa opinião.
Isso apesar de a área sempre
aparecer no noticiário com informações relativas a desrespeito aos
direitos humanos durante ações
policiais e dos altos índices de criminalidade ali registrados (160 jovens de 15 a 24 anos de São Mateus e de Sapopemba foram vítimas de homicídio em 2000).
Foi na região dos bairros de Perdizes, Pinheiros e Lapa que os
pesquisadores encontraram o
maior número de pessoas que
condenam a tortura -81%. Nessa área, há bons indicadores sociais: apenas um jovem vítima de
homicídio em Pinheiros e dois em
Perdizes em 2000, 36% da população com renda familiar acima de
dez salários mínimos e 35% dos
moradores com curso superior.
Esses dois últimos dados, em
cruzamento com outras informações da pesquisa, ajudam a contextualizar melhor a opinião das
pessoas em relação à tortura.
A maioria daqueles que admitem o crime hediondo para que
crimes sejam esclarecidos, sempre ou em determinadas situações, tem um perfil bastante definido: são mulheres, têm entre 16 e
25 anos, cursaram o ensino fundamental ou médio e integram família cuja renda mensal é inferior
a dez salários mínimos.
Quanto maiores o nível de instrução e a renda, menor o apoio à
tortura em ações policiais.
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