São Paulo, domingo, 1 de fevereiro de 1998

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A VIDA IMITA A ARTE
Aluno acusa escola de discriminação sexual

EDMILSON ZANETTI
da Agência Folha, em Araxá (MG)

Um estudante mineiro vive na vida real um drama que lembra o do protagonista do filme belga "Minha Vida em Cor de Rosa", em cartaz em São Paulo.
No filme, ganhador do Globo de Ouro de melhor produção estrangeira de 1997, um garoto de 7 anos acha que na verdade é uma menina e por isso acaba enfrentando problemas na escola.
Na vida real, o estudante D.M.S., 15 -homossexual, como ele se define-, está impedido de estudar em uma escola estadual no município de Araxá, no Triângulo Mineiro.
A direção da tradicional escola Vasco Santos, a mais antiga da cidade, se recusa a aceitar a matrícula do aluno para este ano sob alegação de indisciplina.

Opção sexual
Para o adolescente, que estuda na escola há três anos, sua "expulsão" se deve exclusivamente à sua "opção sexual".
Carismático, ele é uma espécie de líder para os demais alunos. Seus feitos são conhecidos pelos estudantes de toda a escola.
"É um líder negativo", define a diretora, Onilda Soares, 46.
Os atos apontados pela direção como provas da indisciplina do garoto na escola decorrem de sua opção sexual.
Ele já frequentou aula usando calcinha e sutiã, baixou a calça diante dos colegas, desafiou professores, brigou com garotas e chegou a gritar que estava "menstruado" em sala de aula.

Ficção
"Ele cria uma ficção e se coloca como um personagem", diz a diretora.
Todas essas passagens estão registradas no livro de ocorrências da escola e servem como prova para a diretora justificar sua decisão de afastá-lo.
Olinda recebe o apoio de professores e funcionários. "Aqui ele não estuda mais."
As anotações de professores e da orientadora pedagógica da escola nas ocorrências quase sempre fazem referência à opção sexual de D.M.S.
Ao encaminhar o garoto para avaliação psicológica, em junho do ano passado, a diretora escreveu: "Ele destoa dos demais, querendo se mostrar para os moços, fazendo questão de frisar que é mulher, inclusive fazendo convites imorais para os colegas".

Transferência
Por causa de seu comportamento, D.M.S. foi transferido três vezes de turma no ano passado.
A diretora sugere que ele seja transferido de escola. Ela diz ter arrumado uma vaga em outra escola, mas o aluno se recusa a ficar longe dos amigos.
"Isso aqui é minha vida. É o lugar onde passo os melhores momentos", afirma D.M.S.
Ele sustenta com convicção que está sendo vítima de preconceito. "Tem gente muito mais bagunceira que eu que continua na escola", afirma.
Quando soube da decisão da diretora de separar os alunos por sexo em salas de aula este ano, D.M.S. reagiu, dizendo não haver sala onde ele pudesse estudar.
Segundo a diretora, a divisão por sexo é um teste para buscar melhor rendimento dos alunos.
A Secretaria da Educação do Estado de Minas Gerais diz não ter informações sobre o caso de D.M.S. e afirma que só poderá se pronunciar se houver denúncia formal.



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