São Paulo, quinta-feira, 01 de março de 2001

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SAÚDE

Governo estuda permitir venda do analgésico só com receita médica; 33 países já impõem restrições à sua comercialização

Remédio com dipirona deve ser controlado

LISANDRA PARAGUASSÚ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) estuda controlar a venda de medicamentos fabricados com o princípio ativo dipirona, um analgésico que está entre os mais vendidos do Brasil.
A Folha apurou que a tendência do Ministério da Saúde é optar pela exigência da receita médica para a venda de medicamentos à base de dipirona. Hoje, é possível achar esses remédios não só em farmácias e drogarias, mas também em supermercados. Não é preciso apresentar receita médica.
A dipirona é proibida ou tem comercialização restrita em pelo menos 33 países por suspeita de causar problemas no sangue.
Entre eles estão a anemia hemolítica (diminuição dos glóbulos vermelhos) e a agranulocitose (redução dos glóbulos brancos), uma doença que dificulta a reação do organismo a infecções.
De acordo com um estudo do Ministério da Saúde da Alemanha, a incidência da agranulocitose é de 1 caso para cada 20 mil usuários de dipirona. Apesar do número baixo, o governo alemão decidiu controlar o uso da droga porque em 1985 foram registrados no país cem casos da doença relacionados ao produto.
Na segunda quinzena de março, a Anvisa fará uma reunião com médicos, representantes de consumidores e laboratórios para definir o destino da dipirona no Brasil. O assunto vem sendo discutido desde o final do ano passado. "O que for decidido nessa reunião nós deveremos acatar", afirmou Maurício Vianna, gerente-geral de medicamentos da Anvisa.
Segundo Vianna, a agência ainda não tomou uma decisão porque não há conclusões definitivas sobre os riscos. "Há muitas pessoas que condenam e também defensores ardorosos", disse.
Entre os 30 medicamentos mais vendidos no país, 4 são analgésicos feitos a base de dipirona sódica. Entre eles está a Novalgina, da Aventispharma. O laboratório enviou ao Ministério Público Federal um relatório com uma defesa da dipirona ao descobrir a possibilidade de os procuradores proporem uma ação (leia abaixo). A Novalgina é o segundo remédio contra dor mais vendido do país, segundo a Anvisa, e medicamento usado como referência para a fabricação do genérico Dipirona.
Também está na lista um antiespasmódico que contém a substância na fórmula e é um dos principais medicamentos contra cólicas usados no Brasil. Na Vigilância Sanitária consta o registro de mais de 70 remédios feitos com dipirona e outros 140 que utilizam a substância associada a outras.
"A regra de ouro do uso de um remédio é que os efeitos positivos sejam muito maiores que os riscos, que existem em qualquer droga, mas esse não é o caso da dipirona", diz José Rubem Bonfim, médico e presidente da ONG Sobravime (Sociedade Brasileira de Vigilância de Medicamentos).
Bonfim diz que a dipirona para uso comum não faz parte da Rename (Relação Nacional de Medicamentos). A lista é usada pelo Ministério da Saúde e por secretarias estaduais e municipais como referência para a compra de remédios. "Ela só aparece para uso hospitalar, em caso de dor aguda ou febre muito alta. Por que, então, deve ter venda livre?"
Em vários países, o uso da dipirona é permitido apenas em casos especiais. Na Alemanha, o medicamento pode ser receitado apenas em casos de dor aguda ou crônica provocada por trauma, cólicas ou se outros remédios tenham falhado para pacientes que apresentam febre muito alta.
Nos EUA, a droga foi proibida em 1977 para uso comum. Relatório de novembro daquele ano do FDA (Food and Drug Administration) -a Vigilância Sanitária americana- classifica a dipirona como "insegura". O documento é usado até hoje e diz que "seu uso deve ser restrito ao seu efeito antipirético (contra febre) quando há sério risco de vida e quando drogas, como o ácido salicílico, são ineficazes ou contra-indicadas".
A iniciativa de solicitar o controle da substância partiu do Ministério Público Federal. Em 1990, o Ministério Público do Rio Grande do Sul decidiu abrir um processo para proibir a venda no país. Como essa atribuição é do Ministério da Saúde, a ação foi enviada aos procuradores federais.


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