São Paulo, quinta-feira, 01 de março de 2001

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SAÚDE

Para eles, risco da substância é comparável ao de outros analgésicos que continuarão a ser vendidos sem receita

Especialistas criticam controle da dipirona

DA REPORTAGEM LOCAL

Especialistas ouvidos pela Folha dizem não ser necessário tornar a dipirona um remédio controlado, medida que está em estudo na Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
"Há inúmeros estudos mostrando que ela é, entre os analgésicos disponíveis no mercado, a droga menos perigosa", diz Anthony Wong, chefe do Centro de Assistência Toxicológica do Instituto da Criança de São Paulo.
Segundo o especialista em toxicologia, estudos mostram que o ácido acetilsalicílico (princípio ativo da Aspirina), por exemplo, pode provocar a síndrome de Reye (doença rara que afeta o cérebro e o fígado) se for usado no combate a certas doenças febris como a gripe e a catapora.
"A combinação do ácido com o vírus influenza (causador da gripe) pode produzir uma situação que leva à lesão das células do fígado e, consequentemente, a uma hepatite fulminante e a um edema cerebral", afirma.
Wong cita ainda um estudo coordenado pela Organização Mundial da Saúde sobre a suposta associação entre uso de dipirona e incidência de anemia aplástica (doença em que a medula óssea fica incapaz de produzir glóbulos vermelhos, brancos e plaqueta).
O estudo, feito com mais de 23 milhões de pessoas na Europa e na Ásia, mostrou que a incidência da doença não é maior entre os usuários de dipirona em relação ao restante da população.
Sobre um outro ponto polêmico, o risco de a dipirona causar agranulocitose (doença que leva à falta de glóbulos brancos), Wong diz que a probabilidade não é maior do que a de outros medicamentos, como o paracetamol, causarem a doença. "Não posso dizer que a dipirona é inócua. Mas não vejo por que exigir receita para comprar o medicamento."
O especialista Sérgio Graff, chefe do Centro de Controle de Intoxicações de São Paulo, também entende que colocar tarja vermelha no medicamento não é necessário. "O médico não tem como saber se esses efeitos colaterais vão acontecer ou não em um determinado paciente. São efeitos adversos inesperados. Ou seja, não vai mudar em nada a proteção ao paciente o fato de a dipirona ter venda livre ou sob prescrição médica", afirma.
A favor dessa tese conta o fato de o Brasil ser um dos países recordistas no uso da dipirona. "E até onde eu sei não existe estudo apontando o Brasil como o recordista em agranulocitose ou anemia aplástica." Segundo o Ministério da Saúde, estudos no Brasil concluíram pela baixa incidência de agranulocitose -de 0,44 a 0,82 casos por milhão de habitantes.
Na opinião do especialista Antonio Carlos Zanini, chefe do setor de informações sobre medicamentos da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, o risco da dipirona é comparável ao de outros analgésicos.
"Muito raramente, a dipirona pode levar à morte por aplasia. Muito raramente, o ácido acetilsalicílico pode levar à morte por hemorragia, e o paracetamol, por lesão hepática. Ou o ministério encara as três drogas da mesma forma ou essa medida vai ficar com cara de medida política."
Antonio Barbosa da Silva, presidente do Conselho Regional de Farmácia do DF, também defende um tratamento único a todos os analgésicos. "A dipirona tem de ser controlada, assim como o ácido acetilsalicílico."
A dipirona é o analgésico mais vendido no Brasil. No ano passado, só da marca Novalgina (a mais comercializada), foram vendidas 15 milhões de unidades. Em 1998 e 1999, foram 17,6 milhões e 17,9 milhões, respectivamente.
(KÁTIA STRINGUETO)

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