São Paulo, quarta, 1 de julho de 1998

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HIV dribla o coquetel e reduz otimismo

AURELIANO BIANCARELLI
JAIRO BOUER
enviados especiais a Genebra

O otimismo de Vancouver, que dois anos atrás animou o mundo com as esperanças do coquetel, foi substituído pelo realismo e a precaução de Genebra.
A eliminação do vírus HIV, que parecia tão próxima, foi empurrada para um futuro sem data.
O objetivo agora é encontrar drogas e formas de manter o vírus sob o controle do organismo.
Nesse tempo, espera-se que a descoberta de medicamentos mais potentes possam decidir um segundo round contra o vírus.
O cientista norte-americano David Ho, saudado como o cavaleiro da esperança no congresso mundial de Aids do Canadá, fez ontem na Suíça um discurso de pés no chão: apesar de reduzir as hospitalizações e a mortalidade, os esquemas atuais de tratamento continuam sendo driblados pelo HIV.
Ho e outros cientistas disseram ontem que o vírus é capaz de se multiplicar mesmo quando reduzido a baixíssimas quantidades no sangue pela ação do coquetel.
Quando o vírus parecia encurralado e quase eliminado pelas drogas, descobriu-se que estava protegido e adormecido nas células de memória, células especiais do organismo capazes de armazenar informações por um longo tempo.
Como os remédios só agem na fase de multiplicação do vírus, os cientistas terão de encontrar formas para acordá-lo e atacá-lo.
Há descobertas animadoras: o número de vírus nas células de memória estaria sendo reduzido pelo uso prolongado das drogas.
Luis Fernando Brígido, do Instituto Adolfo Lutz de São Paulo, diz que o fato mostra que essas células são sensíveis ao tratamento, o que "é uma boa notícia".
As mesmas drogas estariam debilitando o HIV a tal ponto que sua capacidade de infectar novas células teria diminuído muito.
Estudos mostram também que, quanto mais cedo o tratamento começar, mais chance haverá de o sistema imunológico ser preservado de forma a combater as eventuais sobras de vírus.
O momento, no entanto, é mais de desafios que de apontar vitórias, afirmam os cientistas.
Entre esses desafios, está a busca de combinações e novas drogas que possam, causando menos danos, fortalecer a atividade do sistema de defesa. Outro desafio -diz Mauro Schechter, da Universidade Federal do Rio de Janeiro- é saber quando começar o uso de drogas de forma a danificar menos o sistema imunológico.
Diante de um quadro tão diverso, o cenário de Genebra está dividido entre animação e ceticismo.
Entre os otimistas, o norte-americano Roberto Siliciano, da Universidade John Hopkins, diz que "a cura não é um mito". É uma questão de tempo.



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