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LEGALIZAÇÃO EM DEBATE
Propostas serão anunciadas hoje pela comissão tripartite montada para discutir a revisão da lei
Projeto do aborto deve ser incorporado a outro na Câmara
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
Está praticamente fechada a estratégia de encaminhamento do
anteprojeto do aborto elaborado
pela comissão tripartite no Legislativo. Ele deve ser incorporado
ao projeto de lei 1.135, que tramita
na Câmara dos Deputados desde
1991. O projeto reúne propostas
de outros seis e teve um substitutivo apresentado no ano passado.
Dessa forma, o anteprojeto não
precisaria entrar no fim de uma fila de mais de cem projetos que
aguardam apreciação do mérito
na Comissão de Seguridade Social
e Família (CSSF). Cairia direto nas
mãos da deputada Jandira Feghali
(PC do B), relatora que elaborou o
substitutivo do projeto 1.135.
Com apresentação prevista para
amanhã, o texto final do anteprojeto elaborado pela comissão tripartite -montada pelo governo
federal para discutir a revisão da
legislação punitiva do aborto-
reúne muitas semelhanças ao
substitutivo de Feghali, conhecida
aliada do movimento feminista.
Ambos propõem a descriminalização do aborto até a 12ª semana
de gestação e em qualquer idade
gestacional quando a gravidez
implicar risco de vida à mulher ou
em caso de má-formação fetal incompatível com a vida. Também
asseguram que o SUS realize a interrupção da gravidez e revogam
os artigos do Código Penal que
tratam o aborto como crime.
Segundo Feghali, há duas questões do anteprojeto da comissão
que podem ser incorporadas ao
substitutivo: a obrigação de os
planos de saúde cobrirem os custos com o aborto e a necessidade
de autorização do Ministério Público, além dos responsáveis legais, para que a interrupção seja
realizada em menores de 18.
Após as alterações, o substitutivo segue para votação na CSSF,
que tem 28 deputados. Lá, o projeto encontrará pelo menos dois
parlamentares contrários à causa:
Angela Guadagnin (PT-SP) e o
padre José Linhares (PP-CE), que
também são contra a pílula de anticoncepção de emergência.
Depois disso, ainda há um longo caminho por comissões e plenários, da Câmara e do Senado,
até um dia poder a vir se tornar
lei. "Não será uma luta fácil. Será
um debate acalorado, difícil", prevê a ministra Nilcéia Freire (Política para Mulheres), cuja pasta foi
responsável pela coordenação da
comissão tripartite, criada em
abril e que contou com membros
do governo, da sociedade civil e
do Legislativo.
Na avaliação do senador João
Capiberibe (PSB-AP), que integra
a comissão tripartite, o encaminhamento do projeto pela Câmara não é uma boa saída. Além do
exército de deputados contrários
ao aborto, ele acredita que, em razão da crise política atual (CPI dos
Correios e do "Mensalão"), "não
haverá espaço nem para debate".
Apesar de considerar mínimas
as chances de o anteprojeto ingressar pelo Senado (o que era a
intenção inicial do movimento feminista), Capiberibe afirma que
dará uma última cartada: fará
uma sondagem com pelo menos
12 dos 81 senadores para "ter uma
idéia da receptividade".
Para ele, neste momento o ideal
seria "dar um respiro" com o anteprojeto. "É um assunto espinhoso em um momento muito
delicado. Talvez fosse o caso de
esperar uns dois meses e, nesse
período, esclarecer a população
sobre o que significa a descriminalização [do aborto]."
A senadora Serys Slhessarenko
(PT-MT), que também integra a
comissão, acredita que a melhor
saída seja o ingresso pela Câmara.
Mas, sem mobilização popular, o
projeto dificilmente seguirá
adiante, analisa a senadora.
Para ela, não é preciso ser favorável ao aborto para concordar
que a criminalização de mulheres
por esse motivo é inócua e só colabora para que as pobres continuem morrendo.
Independentemente do encaminhamento no Legislativo, a ministra Nilcéia Freire avalia que o
debate em torno do anteprojeto
foi positivo porque envolveu a sociedade civil e trouxe à tona o grave problema de saúde pública que
representa o aborto inseguro.
O esforço agora, avalia Nilcéia, é
para que o debate não ganhe um
tom maniqueísta. "O aborto é
uma questão residual. Temos é
que diminuir as possibilidades da
gravidez indesejada."
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