São Paulo, sábado, 1 de agosto de 1998

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JUSTIÇA
Artista plástico, que diz ter vivido 23 anos com prefeito de Poá, move duas ações judiciais para recuperar bens
União homossexual gera disputa na Justiça

da Reportagem Local

Uma suposta união homossexual do prefeito morto de Poá (Grande São Paulo), Jorge Francisco Correa Allen, com um artista plástico levou à Justiça a disputa pelos bens que ele deixou, estimados em mais de R$ 500 mil.
No último dia 20, o artista plástico Antonio Bueno, 53, que diz ter vivido com Allen por 23 anos, impetrou duas ações judiciais.
Ele pede o reconhecimento legal da sociedade que os dois teriam mantido como casal e reintegração de posse de alguns bens de ambos que estavam em nome do prefeito e teriam sido tomados por familiares de Allen.
Bueno quer, com as ações, ter direito aos bens que Allen adquiriu desde 1975, quando eles teriam começado a viver juntos.
Segundo a advogada do artista plástico, Paula Berezin, os bens, que incluem três apartamentos e um sítio, entre outros, foram todos registrados em nome do prefeito porque Bueno, sem renda fixa, não teria como comprovar, perante o Imposto de Renda, tais aquisições.
"Além disso, não é preciso que os bens estejam em nome dos dois porque eles tinham uma sociedade de fato, como qualquer homem e mulher que vivam juntos, mesmo sem estarem casados. Esse direito está previsto na Lei do Concubinato, que eu pretendo usar no caso", diz a advogada.
Segundo Paula, "a lei prevê que, quando duas pessoas vivem juntas, fica consagrado um esforço comum na aquisição do patrimônio", o que teria ocorrido no caso do ex-prefeito.
"Eu nunca me preocupei com isso, mas também não esperava que a família (de Allen) me negasse o que é meu", disse Bueno, em entrevista à Folha.
Como provas dessa união, a advogada reuniu declarações de seis pessoas dizendo conhecerem Allen e Bueno e atestando que os dois viviam juntos, além de fotos dos dois juntos em diversas ocasiões, inclusive em viagens, e cartas de amor.
"Eu digo e repito para quem quiser ouvir que os dois viviam juntos pelo menos desde 81, quando eu os conheci", diz Iraci Soares, síndica do edifício Casablanca, em São Paulo, onde há um apartamento em nome de Allen que os dois teriam habitado.
Antonio Lima Machado, 62, porteiro há oito anos do prédio em Suzano onde vive Bueno, confirma a tese de uma vida em comum. "O Jorge passava alguns dias em Poá, porque era prefeito lá. Mas pelo menos duas ou três noites por semana ele passava aqui no apartamento. E todo fim-de-semana eles iam para o sítio."
O apartamento em Suzano também está em nome de Jorge Francisco Correa Allen.

Reintegração de posse
A polêmica em torno dos imóveis, segundo Bueno, teria começado na noite da morte de Allen, vítima de um aneurisma. O artista diz que estava em viagem quando soube da morte.
Ao voltar, as fechaduras do apartamento de Suzano, onde vivia, tinham sido trocadas por familiares do prefeito morto.
O mesmo teria ocorrido no apartamento de Poá. No sítio, os caseiros teriam sido orientados a não permitir sua entrada. Bueno pede a reintegração de posse desses imóveis, além de bens que teriam sido retirados de dentro deles e de um carro Vectra.
Atualmente, após registrar boletim de ocorrência pela troca das fechaduras, ele arrombou a porta do apartamento de Suzano e o ocupou.

Outro lado

Uma irmã e um irmão de Allen disseram em entrevista que não conheciam Bueno.
Já uma outra irmã, Marinês Allen, cuja filha teve Bueno e Jorge como padrinhos de casamento, disse que o conhecia, mas negou que os dois morassem juntos. Ela não comentou a ação judicial.
O advogado da família do prefeito, Munir Jorge, não respondeu às sete ligações feitas pela reportagem ao seu escritório.



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