São Paulo, terça-feira, 01 de outubro de 2002

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Especialista aponta fraqueza do Estado

DA REPORTAGEM LOCAL

DA SUCURSAL DO RIO

Para especialistas em segurança pública ouvidos pela Folha, o toque de recolher generalizado no Rio revela o "alargamento do círculo do medo" além das áreas controladas à força pelos traficantes de drogas.
Guaracy Mingardi, pesquisar da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre tráfico de drogas e secretário de segurança em Guarulhos (Grande SP), lembra que o fechamento do comércio começou em áreas restritas, controladas pelos criminosos.
"Eram áreas em que os criminosos podem prender ou soltar, por exemplo", disse Mingardi. Segundo ele, foi a sucessão desse tipo de demonstração de força, aliada à ineficácia do Estado em reprimi-la, que fez com que esse poder de ameaça ultrapassasse as áreas dominadas.
Na comparação com a cidade de São Paulo, Mingardi afirmou que esse tipo de demonstração de força ainda é tímido, em áreas muito restritas. "Mas em dois ou três anos, se nada for feito, isso pode estar em outro patamar, como ocorreu no Rio."
Segundo o ex-ministro da Justiça Miguel Reale Jr., o toque de recolher no Rio é uma consequência da "ausência do Estado". "Aí o crime organizado toma conta", afirmou Reale Jr.

Boatos
O cientista político Paulo Bahia, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), afirmou que o Rio viveu ontem um fenômeno em que os boatos acabaram criando uma realidade.
Bahia, que escreveu uma tese sobre boatos na política e no mercado financeiro e lançará livro neste mês sobre o assunto, disse ter saído às ruas ontem com um gravador para checar a veracidade de informações difundidas.
"Primeiro, diziam que a avenida Brasil [uma das principais da cidade" estava completamente fechada. Fui até lá e vi que não era verdade. Falaram também que todo o comércio na Ilha do Governador [zona norte" estava fechado. Vi que apenas uma parte estava fechada. Depois da circulação dos boatos, no entanto, os comerciantes do bairro começaram a fechar", disse Bahia.
O sociólogo Ignácio Cano disse não ter dúvidas de que houve uma ação coordenada. "Claramente, não é um caso de fechamento por luto, como estamos acostumados", disse Cano.
Para o antropólogo Rubem César Fernandes, diretor da ONG Viva Rio, o fechamento das lojas ocorreu porque a facção criminosa Comando Vermelho está se sentindo pressionada.
"Foi uma tentativa de afirmação de poder do crime organizado diante do Estado. Foi também um ato com intenção de fragilizar o governo no momento em que há uma campanha eleitoral", afirmou Fernandes.


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