|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MARILENE FELINTO
Operário em país sem peito
Quer dizer que o trabalho
aqui não vale nada. Quem
determina quanto vale o suor e o
sacrifício é o dólar. As pessoas ficam de bestas, ouvindo falar da
"crise" econômica. Que crise?
Criada por quem? O trabalhador
continua no seu dia-a-dia, entrando todo dia em ônibus cheio,
em trem lotado, num percurso de
uma, duas horas até chegar à indústria, à firma, à escola, à casa
do patrão. Ou sai para a roça, de
sol a sol, remexendo a lavoura
dura. Nada disso vale.
Só se fala na "falência", na
"quebra" do país -essa espécie
de Iraque do mundo das finanças
em que o Brasil se transformou,
perseguido pelo capital internacional como um aluno vagabundo pelo professor severo.
Quem imaginou que viveria
numa republiqueta como esta, de
onde saem toda semana executivozinhos constrangidos e constrangedores, sobraçando pastas e
valises cheias de papéis e explicações inúteis rumo aos centros financeiros dos EUA? Vão mendigar por mais dinheiro, pedir um
ponto aqui, um "meio-certo" ali,
para evitar a bomba no final do
ano. Ridículo. Um país grande como este, tão cheio de recursos, humilhado feito um colegial. Poderia liderar blocos continentais, fazer alianças importantes com os
"emergentes" e os afogados de todo tipo para enfrentar a exploração dos super-ricos. Mas não. Não
faz coisa nenhuma.
Especialmente na última década, o país entregou-se de joelhos à
especulação financeira, aos ladrões que o mundo chama de "investidores", governado por um
grupo de dândis vaidosos, que
ainda vive de acreditar que futebol é dólar -e que só querem
mesmo é ficar zanzando de Brasília a Paris, fingindo que aqui está
tudo bem, por puro complexo de
inferioridade.
Um relatório divulgado neste
ano pelo Cebri (Centro Brasileiro
de Relações Internacionais), resultado de longo estudo sobre as
relações Brasil/Estados Unidos,
revelou que os representantes
brasileiros da área de relações internacionais não sabem fazer valer lá fora as posições do país. São
acanhados ou despreparados, defendem apenas timidamente o
Brasil em foros e negociações internacionais. Sofrem de complexo
de inferioridade diante de estrangeiros, não sabem dizer não e fogem de conflitos em vez de enfrentá-los quando necessário.
Junte-se a isso o fato de que o
desempenho dos alunos da elite
brasileira no ensino fundamental
está muito abaixo dos padrões internacionais de países mais ricos
ou em desenvolvimento -segundo pesquisa recente de Creso
Franco, da PUC-RJ-, e considere-se que os homens das relações
internacionais do Brasil vêm da
elite político-econômica, para se
concluir que: estamos perdidos.
Quem sabe o operariado no poder não terá peito suficiente (e
senso de realidade) para botar os
pingos nos is, falar grosso e colocar de novo o Estado para funcionar sem servidão ao estrangeiro.
Ao menos já se sabe que pobre paga contas melhor que rico. É só fazer um levantamento nos carnês das Casas Bahia.
E-mail - mfelinto@uol.com.br
Texto Anterior: Especialista aponta fraqueza do Estado Próximo Texto: Trânsito: Via na zona oeste passa a ter mão única Índice
|