São Paulo, domingo, 1 de novembro de 1998

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SAÚDE
Maioria dos colégios não possui nenhum preparo para receber estudantes portadores do vírus HIV; situação é mais grave nas particulares
Escola não sabe conviver
com criança com Aids

AURELIANO BIANCARELLI
da Reportagem Local

A maioria das escolas não está preparada para receber crianças com Aids nem se preocupa em ensinar seus alunos a conviver sem preconceitos com os doentes.
Estudantes e professores se comportam como se a epidemia estivesse distante dos bancos da escola. Na verdade, nunca esteve tão próxima: a Apta, uma ONG de São Paulo que trabalha com prevenção em escolas, estima que pelo menos 6.000 crianças com Aids ou HIV estejam frequentando colégios públicos e privados.
A tendência é que o número salte a cada ano. Com os novos medicamentos e melhor atenção médica, as crianças que antes morriam nos primeiros anos estão agora chegando com saúde ao ginásio.
O alerta para o "descuido" das escolas foi feito esta semana por especialistas de colégios públicos e privados e por profissionais que trabalham com Aids e prevenção.
"As escolas têm que se preparar para uma realidade cada vez mais próxima", diz Marinella Della Negra, responsável pelo serviço do Hospital Emílio Ribas que já atendeu mil crianças com Aids. Cerca de 400 delas estão em tratamento e cem já frequentam escolas.
Na semana passada, quatro instituições que abrigam crianças com Aids lançaram uma gincana que contava com a participação de escolas particulares. De mais de 40 colégios convidados, apenas três aceitaram, o Albert Sabin, o Itatiaia e o Marco Polo.
A gincana estabelece uma série de tarefas envolvendo o tema "Aids e preconceito", com pesquisa, entrevistas, peça de teatro e até uma campanha publicitária.
"A intenção é conscientizar os estudantes para a convivência e a solidariedade", diz o padre Júlio Lancellotti, da Casa Vida, instituição que abriga crianças com Aids e que já tem 16 delas em escolas.
Entidades que trabalham com prevenção e sexualidade dizem que o interesse é maior entre as escolas públicas. "As raras escolas particulares que solicitam nosso trabalho querem apenas uma palestra", diz a diretora da Apta, Terezinha Reis Pinto.
"São pouquíssimos os colégios que têm um trabalho continuado", diz a socióloga Rosana Gregori, da Ecos, ONG especializada em sexualidade e que também trabalha com escolas. "Mostramos aos alunos que a Aids está aumentando entre os jovens heterossexuais e que as crianças com o vírus estão vivendo cada vez mais. A intenção não é assustá-los, mas desmontar o mito de que a Aids está longe deles", afirma.
As escolas reconhecem a dificuldade em tratar o assunto. "Há uma espécie de rejeição por parte dos alunos, como se eles já soubessem de tudo e o tema fosse repetitivo", diz Sylvia Figueiredo Gouvêa, diretora da Escola Lourenço Castanho, ex-membro do Conselho Estadual de Educação e ex-diretora pedagógica do Grupo-Associação de Escolas Particulares. Sylvia reconhece que há também uma resistência por parte das escolas.
Na rede pública do Estado, um projeto para crianças de 1ª a 4ª série será iniciado no próximo ano, complementando um programa já em andamento nas outras séries.



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