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GILBERTO DIMENSTEIN
Meia volta, volver
Quando dava os retoques
no pacote de redução de gastos
e aumento de impostos, a equipe do presidente Fernando
Henrique Cardoso esbarrou
numa barreira militar. E saiu
perdendo.
Já tinha sido acertada a
ofensiva no bolso dos funcionários federais civis para forçá-los a pagar mais pela aposentadoria integral.
Por uma simples questão de
lógica, a tesoura mirou os militares, beneficiários de um privilégio maior. Mas não cortou;
preferiu os desarmados civis.
Os militares desfrutam, além
de aposentadoria integral, patrocinada com dinheiro público, de um "adicional de inatividade".
Ao abandonar a farda, o militar tem uma ajuda extra, engordando seu rendimento.
Se já é inusual alguém parar
de trabalhar sem abaixar os
rendimentos, raríssimo é ganhar mais.
A crise na qual estamos metidos, obrigando a redução de
gastos públicos, vai expondo
com avassaladora crueza o peso que a sociedade suporta para bancar as estripulias oficiais.
As estatísticas sobre aposentadorias são a personificação
do escárnio.
No Executivo, a média da
aposentadoria é de 13,4 salários mínimos; no Legislativo,
32,8; no Judiciário, 33,2.
Compare: o INSS paga, em
média, 1,8 salário mínimo.
A perversidade se estende a
Estados e municípios, onde as
receitas estão comprometidas
bem além do razoável com a
folha de pagamento.
Há municípios que drenam
para o bolso de seus servidores
tudo o que recebem do contribuinte.
É resultado de um crônico e
irresponsável empreguismo,
respondendo a interesses de
grupos políticos.
A palavra servidor, assim,
perde sentido. É a população
que vira servidor.
Nada disso é novo, óbvio.
Novo é o tamanho da crise
que invade o país, anunciando
aumento do desemprego e redução dos investimentos em
educação e saúde.
Somos reféns da máquina inchada e perdulária, obrigada a
caçar dinheiro - o que, traduzindo, significa juros altos.
O consumidor entende juros
altos quando vê a conta de seu
cartão de crédito ou da prestação.
Mas, muitas vezes, não percebe que também paga com seu
emprego; juros altos significam
a dificuldade de o empresários
investirem, alargando a produção.
São levados, assim, a pegar
dinheiro lá fora; sem essa possibilidade, sufocam. Justamente o que está acontecendo.
Amarrado pela Constituição,
o presidente Fernando Henrique Cardoso anunciou mais
aumento de impostos, punindo
quem deseja produzir.
O presidente é, até certo ponto, refém. Mas nem tanto como
quer se apresentar à opinião
pública.
Tivesse guerreado mais pelas
reformas, deixando para segundo plano a conquista de
um novo mandato, possivelmente haveria maior margem
de manobra.
É difícil, talvez impossível,
estabelecer todas as culpas; governadores e prefeitos também
assumem com monumentais
rombos. Nem temos tempo.
O fato: chegamos ao ponto de
termos a sensação da falta de
alternativas.
Caso não se apresentem cortes, os recursos externos, uma
espécie de oxigênio, desaparecem.
Junte-se a dramaticidade do
descaso público à ignorância
popular.
A imensa maioria da opinião
pública não sabe o que está em
jogo pela simples razão de que
desconhece a teia complexa
por trás da briga.
Não percebe a ligação entre
os rombos dos orçamentos oficiais e a dificuldade de conseguir recursos para o Brasil
prosperar.
Certamente é grego expor a
ligação entre aprovação do
FMI, redução do déficit público, entrada de dólares e combate à inflação.
Mas quem está no Congresso
sabe que, neste momento, brincar com a crise vai queimar
muito mais gente do que se
imagina.
As crises provocam dor, mas
têm um magnífico aspecto, por
alertar sobre o esgotamento de
processos e estimular soluções
inovadoras.
Esta crise (quando sairmos
dela), vai mostrar ao país, definitivamente, que a prosperidade nacional depende, em
boa medida, da capacidade do
público controlar a coisa pública.
É uma briga a pagar se quisermos ter mais empregos, escolas e hospitais.
PS- Podem me chamar de ingênuo, mas continuo otimista.
Quando sairmos dessa pancadaria, seremos um país fortalecido, com uma sociedade mais
vigorosa.
O Brasil não pára de melhorar e tem sabido aproveitar as
quedas, sabendo sair melhor-
mais por causa da sociedade
do que dos governos.
E-mail: gdimen@uol.com.br
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