São Paulo, domingo, 02 de abril de 2006

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AVANÇO NA MATA

Polícia Ambiental flagra duas irregularidades por mês em empreendimentos construídos em área de serra

Condomínios de luxo invadem a Cantareira

FABIO SCHIVARTCHE
ALENCAR IZIDORO

DA REPORTAGEM LOCAL

A invasão da serra da Cantareira por condomínios residenciais de médio e de alto padrão tem agravado os impactos ambientais em uma das principais áreas verdes da cidade de São Paulo.
Centenas de novos moradores são atraídos a cada ano por empreendimentos em busca de ar puro, silêncio e segurança, por detrás de muradas fortificadas. Na bagagem, trazem um progresso que degrada o ambiente, ameaça a rica biodiversidade da região e piora a qualidade de vida de outros paulistanos.
Somente a Polícia Ambiental tem flagrado duas irregularidades por mês nesse tipo de condomínio. Mesmo os que estão regulares são motivo de preocupação devido às brechas na legislação.
O residencial Village Palmas, da Bancoop, é um dos alvos de contestações pelos impactos ambientais. A Secretaria do Verde e do Meio Ambiente cita a "supressão de vegetação, interferência em APP (Área de Preservação Permanente), maus tratos na vegetação arbórea e inadequada preservação da vegetação", irregularidades encaminhadas à Promotoria.
A pasta diz ter firmado um termo de ajustamento de conduta com os empreendedores, cujas exigências ainda não foram "integralmente" atendidas.
Mas cerca de cem casas do Village Palmas já foram entregues -e outras dezenas permanecem em obras, "no meio do verde", como exalta a sua propaganda.
O condomínio The House é outro alvo de reclamações ambientais. A placa publicitária anuncia: "Um jeito único de viver". E já atraiu 21 compradores, que pagaram entre R$ 469 mil e R$ 545 mil por uma casa, ainda em construção, perto da mata da serra da Cantareira, tombada pelo patrimônio histórico e parte do cinturão verde da reserva da biosfera.
A Polícia Ambiental já chegou a multar os empreendedores em R$ 6.745, no ano passado, pelo corte de 46 árvores. Hoje ele está regular e os acertos ambientais estão sendo cumpridos, segundo a prefeitura. Mas os troncos despedaçados seguem no local.
Não muito longe dali outro condomínio sobe rapidamente: o Itatinga 2, em frente ao Itatinga 1, que abriga há alguns anos cerca de cem casas de alto padrão. Fica tão próximo da floresta que moradores instalaram rede de proteção para que gambás e outros animais não entrem nas casas.
O Itatinga 1 foi motivo de reclamações pela construção de residências próximas a um córrego. Baseado no código florestal, o Ministério Público cobrava uma distância mínima de 30 metros para evitar poluição e interferência no curso d'água. Os empreendedores defendiam 15 metros, com base numa lei mais antiga.
"Fizemos um acordo para que eles ampliassem a distância para 30 metros onde fosse possível e doassem área verde para a prefeitura", afirma Carlos Salles, que é promotor do Meio Ambiente.
Uma comissão da Câmara Municipal começou uma investigação no mês passado. Listou mais de 20 condomínios recém-inaugurados ou ainda em construção nos entornos da Cantareira. E dezenas de imóveis velhos em grandes terrenos à venda -um prato cheio para as imobiliárias que estão descobrindo essa região.

Preocupação
Para Fernando Délcio, administrador do Parque da Cantareira, empreendimentos ilegais, que não possuem alvará de construção da prefeitura ou licença do Estado para cortar mata nativa, e os legalizados, que se aproveitam de brechas na lei, são preocupantes. A maior brecha é a falta de uma regulamentação rígida para a chamada zona de transição entre a mancha urbana e a área de preservação (leia texto nesta página).
"O Itatinga 1 é uma aberração. Produz impacto direto na mata e não cumpre a função de transição", afirma Juscelino Gadelha (PSDB), vereador que preside a comissão da Câmara.
O loteamento Parque Itaguaçu, na Freguesia do Ó, beneficiou-se da falta de rigor na ocupação dos entornos da Cantareira. Numa área equivalente a metade do parque Ibirapuera serão construídos vários condomínios, alguns com prédios de até cinco andares. A intenção é atrair 20 mil moradores.
Mesmo com licenças expedidas pelo Estado, o Itaguaçu foi alvo de blitz da polícia, que flagrou lenhadores com motosserras em área protegida. "Não desmatamos de forma generalizada, mas numa área tão grande como essa é possível que tenha ocorrido alguma infração", admite Gilda Mendes, diretora do loteamento.
De um lado, aumenta a quantidade de condomínios que tentam se regularizar. Em 2004, foram feitos 169 termos de averbação de área verde no Departamento Estadual de Proteção dos Recursos Naturais -quando os compromissos de preservação passam a constar da matrícula do imóvel. Em 2005, eles somaram 290.
De outro, a Polícia Ambiental flagra cada vez mais irregularidades na região. Foram 18 autuações em 2004 e 23 no ano passado.


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