São Paulo, quinta-feira, 02 de abril de 2009

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PASQUALE CIPRO NETO

A resposta está no nome do tempo verbal...


O nome do pretérito mais-que-perfeito é perfeitamente condizente com o que esse tempo verbal expressa

O ÚLTIMO VESTIBULAR da Unifesp trouxe questões baseadas em fragmentos de "Memórias de Um Sargento de Milícias", de Manuel Antônio de Almeida. A banca apresentou os fragmentos em duas "partes": a primeira, em quadrinhos, apresentada como "releitura de uma passagem do início do romance", extraída (e adaptada) de www.fotolog.terra.com.br/biradan tas; a segunda parte do fragmento foi extraída do próprio romance.
Eis as duas partes, unidas: "Era no tempo do rei. (...) Fora Leonardo Pataca algibebe em Lisboa, sua pátria.
Aborrecera-se e viera ao Brasil. (...) Mas viera com ele, no mesmo navio, (...) uma certa Maria da Hortaliça (...) quitandeira das praças de Lisboa, saloia rechonchuda e bonitota. Leonardo com o ferrado sapatão assentou-lhe uma valente pisadela com o pé direito. A Maria deu-lhe um tremendo beliscão. (...) Quando saltaram em terra, começou a Maria a sentir certos enojos: foram os dois morar juntos: e daí a um mês manifestaram-se claramente os efeitos da pisadela e do beliscão; sete meses depois teve a Maria um filho (...) E este nascimento é certamente de tudo o que temos dito o que mais nos interessa, porque o menino de quem falamos é o herói desta história".
O enunciado de uma das questões era este: "Observando as formas verbais fora, aborrecera-se e viera, é correto afirmar que representam ações: a) simultâneas, por essa razão expressas todas no mesmo tempo e modo verbal; b) inconclusas em um tempo anterior ao plano das ações narradas no pretérito imperfeito; c) simultâneas e frequentes no tempo passado, daí a opção pelo pretérito imperfeito; d) situadas em diferentes momentos, por isso expressas em diferentes tempos verbais; e) situadas num tempo anterior ao plano das ações narradas no pretérito perfeito".
No fundo, no fundo, a banca quis verificar se o candidato reconhece o tempo verbal das formas destacadas e, sobretudo, se sabe por que o tal tempo tem o nome que tem.
Pergunto eu a você, caro leitor: já lembrou o nome do tempo em que estão as formas "fora", "aborrecera-se" e "viera"? Elas são do mais-que-perfeito, palavra composta que, por sinal, a bendita reforma manteve com os dois hífenes.
Volte ao fragmento da obra de Almeida, por favor. É óbvio que as três ações não são simultâneas, mas consecutivas. Primeiro Leonardo Pataca exerce o ofício de algibebe ("aquele que fabrica e vende roupas de fazenda ordinária", na definição do "Aurélio"), depois se aborrece e por fim vem ao Brasil.
Se não são simultâneas, por que essas ações são expressas no mesmo tempo verbal? Porque marcam fatos (concluídos) de um período anterior ao da viagem ao Brasil.
Pois foi justamente nessa viagem que Leonardo assentou "uma valente pisadela" em Maria da Hortaliça, o que foi, com perdão pelo trocadilho, o pontapé inicial do casamento, gravidez, rebento etc.
A forma "assentou" é do pretérito perfeito (assim como as que vêm em seguida: "deu", "saltaram", "começou", "foram", "manifestaram-se" e "teve"). É por isso que estão no mais-que-perfeito os fatos anteriores aos expressos pelo perfeito.
Moral da história: o nome do pretérito mais-que-perfeito é perfeitamente condizente com o que esse tempo expressa (fato mais velho que o expresso pelo perfeito).
Antes que me esqueça, é preciso dizer que a resposta é... Você certamente já deduziu que é "e". É isso.

inculta@uol.com.br


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