São Paulo, domingo, 02 de maio de 2004

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SAÚDE

Exercícios fortalecem o registro da informação e a organização dos dados e ajudam a compensar o déficit cognitivo

"Ginástica" estimula memória na velhice

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

"Fazer o nhoque e colocar a nota de R$ 1 embaixo do prato". Essa era uma das anotações na agenda da aposentada Maria Helena Flores, 61, de Amparo (SP), na última quinta-feira, dia 29, dia do tradicional "nhoque da sorte". Há um ano, ela escreve na agenda todos os compromissos e faz exercícios adicionais de memorização.
As estratégias, adotadas quando a aposentada começou a esquecer itens de compras, objetos guardados dentro de casa ou datas importantes, integram um tipo de "ginástica" cada dia mais freqüente na terceira idade: o estímulo da memória e de todo o sistema cognitivo por meio de jogos e exercícios. Eles fortalecem o registro da informação e a organização dos dados na memória, ajudando a compensar o declínio cognitivo.
No processo de envelhecimento, alguns sistemas da memória sofrem declínio. A memória operacional (de curto prazo), responsável pela manipulação da informação, e a episódica (de eventos específicos) são as mais afetadas. Porém a memória semântica, aquela que guarda o significado de objetos e fatos, geralmente fica preservada na velhice.
Embora haja consenso sobre a eficácia dos jogos e dos exercícios de memória, médicos defendem a necessidade de respeitar as habilidades do idoso na hora de indicar essas atividades.
"Para alguns idosos, preencher um diário ou uma agenda, por exemplo, pode ser motivo de angústia. É necessário entender o processo cognitivo de cada idoso para indicar a reabilitação correta", diz a neuropsicóloga Jacqueline Abrisqueta-Gomez, coordenadora clínica do Sari (Serviço de Atendimento e Reabilitação do Idoso) da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
A aposentada Irma Isaura Tres, 88, por exemplo, usa a costura e as listas de supermercado como "terapia antiesquecimento". "Estou com a mente sempre ativa. Procuro me esforçar para lembrar as coisas que esqueço", afirma. A filha, Wandercy Rodrigues, 62, segue o mesmo caminho. Além de jogos no computador, treina a memória contando números de placas de carro e também faz bordados em ponto de cruz.
Outra estratégia, recomendada pela fonoaudióloga Ana Alvarez, pesquisadora do laboratório de neurociências do Instituto de Psiquiatria da USP, é usar o olfato para "fixar" na memória novos aprendizados. "O cheiro do alecrim, por exemplo, é um ótimo aliado na hora de memorizar informações que não podem ser esquecidas", afirma.
Ler e assistir a filmes são outras dicas, mas é preciso comentá-los com uma outra pessoa para que não haja esquecimento.

Demência
Para a psicóloga Valéria Bellini Lasca, mestre em gerontologia pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), os meios externos, como agendas e bilhetes, são recursos que ajudam a memória do idoso. "Ninguém é obrigado a guardar tudo na memória. É preciso arquivar somente o que é importante."
No seu trabalho de mestrado, Lasca acompanhou 39 idosas de Amparo (SP) -Flores foi uma delas. Todas passaram por testes prévios para excluir possíveis problemas patológicos, como a doença de Alzheimer.
Segundo a psicóloga, as idosas com tendência a depressão apresentaram comprometimento da memória e tiveram pior desempenho nos exercícios. Outra conclusão, já citada em trabalhos anteriores do gênero, mostra que, quanto maior o número de anos de estudo, mais habilidade de memória o idoso possui.
Um mito que os profissionais que trabalham com a terceira idade querem derrubar é a crença de que todo esquecimento na velhice leva à demência. "É normal esquecer fatos recentes e lembrar deles depois de algum tempo. O anormal é esquecê-los definitivamente", diz Luiz Roberto Ramos, chefe do Centro de Estudos do Envelhecimento da Unifesp.
Mas, quando o esquecimento começa a interferir na qualidade de vida da pessoa, é preciso uma criteriosa investigação, que inclua testes neurológicos e das condições clínicas do paciente, porque pode tratar-se de um distúrbio cognitivo patológico.


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