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São Paulo, sábado, 02 de agosto de 2003

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Entre prós e contras, especialistas acham projeto da Prefeitura de São Paulo bom na teoria, mas com problemas na prática

Sucesso de CEUs depende de qualificação

DA REPORTAGEM LOCAL

Especialistas em educação consideram o projeto dos CEUs bom na teoria, mas ressaltam que seu sucesso, na prática, depende de fatores como qualificação de professores, um projeto pedagógico diferenciado e uma gestão interna que possibilite a interação não só com a comunidade mas também com o resto da rede escolar.
"Levando em conta a experiência dos Cieps [Centros Integrados de Educação Pública, implantados no Rio, nos anos 80, pelo ex-governador Leonel Brizola], o projeto [dos CEUs] é importante. Mas a prática no Rio enfrentou problemas. Os equipamentos são necessários, mas é fundamental ter também profissionais altamente preparados e um projeto pedagógico novo", diz o reitor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Aloisio Teixeira.
Outro ponto da experiência carioca que pode servir de contra-exemplo, diz, foi o abandono da rede "convencional" de ensino.
"No cenário atual da educação brasileira, temos de nos preocupar com qualidade, o que só se consegue dignificando o professor. Forma e conteúdo têm de andar juntos", diz Jader Nunes, coordenador da comissão de LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) da Andifes (associação de reitores das universidade federais) e reitor da UFPB (Universidade Federal da Paraíba).
"O mais importante é como a gente dá as aulas porque, se eu não trabalhar uma nova forma de ensinar matemática, português, geografia, não adianta introduzir dança, teatro, computador. Essas coisas [teatro, cinema, dança] são boas, mas só serão úteis se o jeito de ensinar for outro. Se for o de sempre, não vai fazer diferença", afirma a ex-deputada federal Esther Grossi, um dos principais nomes do PT na área de educação.

Gaiola de ouro
Alguns críticos são mais duros.
"A única diferença entre os alunos das escolas "normais" e os dos CEUs é que os primeiros estão numa gaiola enferrujada, enquanto os segundos estão numa gaiola de ouro. O que importa, a gaiola, não muda", diz Vitor Henrique Paro, professor titular da Faculdade de Educação da USP.
Segundo ele, a educação pública não vai melhorar com os CEUs porque as causas de sua deficiência -salas superlotadas, professores mal pagos, currículos distanciados da realidade dos alunos etc.- não vão ser atacadas.
"Não é um projeto de educação, é uma desconversa. Por que não pegar esse dinheiro e investir em toda a rede de ensino público? Por que não melhorar as praças que já existem na cidade? Por que não cuidar das piscinas públicas?"
Já Hebe Tolosa, secretária da Educação na gestão Celso Pitta (97-00), citou o antropólogo Darcy Ribeiro (22-97) para criticar: "O bom educador consegue ensinar até em praça pública."
Ela diz ainda que o projeto pode gerar "revolta" ao colocar, na mesma região, crianças no CEU e outras em locais precários, como as "escolas de latinha".
Mas os CEUs também têm defensores. "Todo gasto em educação é bem aproveitado se houver dedicação dos educadores e alunos", diz Ennio Candotti, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
"Há diversas formas para qualificar a educação no país. Esse projeto é um dos meios", afirma Nelio Bizzo, vice-presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação e ex-secretário da Educação de Marta.
Bizzo diz que o planejamento arquitetônico dos CEUs incentiva pais e crianças a procurarem a escola porque une lazer e educação.
Ele sustenta ainda que o espaço permite que professores de uma região encontrem-se para debater e fazer treinamentos, criando assim uma rede entre as escolas.
É exatamente a defesa do também ex-secretário da Educação Fernando José de Almeida que deu o pontapé inicial nos CEUs.
"São Paulo não vai cair nos mesmos erros dos Cieps. O CEU viabiliza a valorização da população porque o primeiro agente sociabilizador de quem vive na periferia é a escola e, se ela é bonita, com uma infra-estrutura boa, o aluno entra na vida como alguém que se valoriza, que tem auto-estima."
O presidente da comissão de Educação da Câmara Municipal, Beto Custódio (PT), diz que a implantação dos CEUs vai "beneficiar a periferia" porque reúne opções culturais e sociais. Ele esteve ontem na inauguração do primeiro centro, em Guaianazes, uma de suas principais bases eleitorais.


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