São Paulo, sexta-feira, 02 de setembro de 2005

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COLETA SELETIVA

Moradores isolam sacos para evitar sujeira gerada por quem revira o lixo atrás de objetos para reciclagem

Prédios instalam lixeiras anticatador de rua

JOSÉ CARLOS PEGORIM
DA REDAÇÃO

"Eles abriam tudo, tudo, a calçada ficava uma sujeira", mas depois "melhorou muito, não resta dúvida". A calçada do prédio na rua Dona Veridiana, na Vila Buarque (região central de São Paulo), onde trabalha o zelador João Mazotti, 62, não dá mais problema. Há quatro anos, por idéia da então síndica, foi trocada a antiga lixeira aberta por uma com tampa e cadeado para evitar que catadores rasguem os sacos de lixo atrás de materiais recicláveis.
Os moradores cansaram de sujeira na porta de casa; os catadores querem apenas garimpar o "ouro" perdido nos sacos pretos.
As lixeiras fechadas são incomuns, mas já estão em Indianópolis, Pinheiros, Vila Buarque e Higienópolis. Normalmente são pedidas a um serralheiro ou feitas sob encomenda por fornecedores de material para condomínios. O preço varia de R$ 250 a R$ 800.
Às 17h o cadeado é colocado para impedir que as dezenas de carroceiros que cruzam a Dona Veridiana os vasculhem. Mazotti só abre a lixeira para o "catador de confiança", que não deixa sujeira.
Ali perto, na Martim Francisco, a zeladora Lindineide da Costa Figueiredo, 45, pôs a mesma lixeira fechada com grade. A sua tem até tela interna. Está há dez anos no posto, que era do marido. "A gente botava o lixo, os catadores vinham e faziam a maior bagunça."
A moradora Marlene Ferraresi, 59, acompanhou o aumento dos catadores da janela do apartamento: "Há dez anos não tinha problema", afirma.
Zeladores e moradores, catadores organizados e técnicos concordam com a associação entre aumento de catadores e desemprego. Uma pesquisa que a Secretaria Municipal do Trabalho divulga hoje mostra que quase 60% deles trabalhavam antes com carteira assinada e que pouco mais da metade entrou no negócio há no máximo quatro anos.
Envolvidos nessa expansão, os zeladores dizem recear um atrito ao pedirem ordem, pois não sabem qual será a reação.
O paraibano Enoque Euclides da Silva, 39, convenceu o síndico do edifício na alameda Guaramomis (Indianópolis, zona sul) a investir, há dois meses, numa lixeira com tampa e dois cadeados. Sobre a tela interna, papelões protegem o metal mais fino da corrosão dos líquidos gerados pelo lixo, o chorume. "Agora o prédio fica limpo", avalia ele.
Ele copiou a idéia do prédio na vizinha rua Jandira. Lá, José da Costa Silva, 51, que trabalha em prédios desde 1972, bolou ele mesmo o projeto da lixeira. "No Morumbi [onde trabalhava] eu tinha problema, mas não como aqui." O bairro, plano e com muitos prédios de luxo, é vasculhado o dia inteiro por catadores com suas carroças de mão. O síndico Sérgio Tadeu Fraia, de 47 anos, empresário do ramo de distribuição de petróleo, conta que os lixeiros pararam para elogiar a lixeira fechada: "Eles adoraram porque fica tudo organizado".
Atento à nova tendência dos prédios de Indianópolis, o catador José Apolinário Ribeiro, 53, acha que "vai fechar tudo, não vai poder mais catar". Conta que nasceu e viveu no bairro, mas hoje fica na Chácara Flora -dormiria na rua naquela noite.
Nos bons dias, puxa 200 quilos de papelão, que lhe rendem R$ 12, vendidos para o Caipira, intermediário da avenida Água Espraiada. Garante ser cuidadoso, lamenta o malfeito dos outros e acredita conhecer as conseqüências para o restante da cidade: "As mulheres rasgam o lixo. Aí entope bueiro, entope tudo", afirma, referindo-se às catadoras.


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