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O DEPOIMENTO
Empresário diz ter ficado 15 dias trancado dentro de um quarto sem banheiro, dormindo em colchonete
'É um pavor tremendo, uma coisa medonha'
da Reportagem Local
Menos de sete
horas depois de
ser libertado, o
empresário
Girsz Aronson
fez questão de
falar à imprensa. Aronson
concedeu uma entrevista tumultuada, em uma sala no 11º andar
do edifício da loja G. Aronson da
rua Conselheiro Crispiniano, centro de São Paulo.
Foi nesse endereço, no térreo,
que o comerciante foi sequestrado, em 17 de setembro.
O empresário, que tinha um curativo no nariz, com suspeita de
fratura, começou a entrevista
agradecendo o sigilo mantido pelos meios de comunicação. Leia a
seguir trechos de seu depoimento.
(RODRIGO VERGARA)
O SEQUESTRO - "Eu cheguei (à
loja) às 5h30 da manhã, como todo dia. Quando eu cheguei, eu trago sempre o (jornal) "Estadão", e
pus "O Estado" na mesa. Dali a
pouco entraram três... não sei nem
o nome que eu vou dizer para
eles... de metralhadoras. Puseram
um capuz na minha cabeça, me
agarraram e me jogaram dentro de
um carro. Eu resisti, resisti, gritei,
pedi socorro para todo mundo do
meu lado. Não me bateram. Me
empurraram, fizeram tudo para
me empurrar, só, né? Aí pedi socorro, mas ninguém me atendeu."
O LOCAL DO CATIVEIRO -
"Nem sei (onde é), porque fui jogado dentro do carro e fiquei agachado, puseram uma máscara em
cima de mim, eu fiquei com um
capuz na cabeça o tempo todo. Eu
acho que viajei umas duas horas
de carro, todo estrumbicado, com
as costas quebradas da posição em
que eu fiquei. Quando chegamos
lá, eles me jogaram janela adentro,
foi quando eu caí de cabeça e me
machuquei. Eu acho que quebrei o
nariz."
O CATIVEIRO - "Eu só fiquei em
um quarto, numa tenda, e, dentro
da tenda, eu fiquei imobilizado,
porque eu não podia sair. Era uma
tenda para eu dormir, dentro de
um quarto. Aí eu pedi a eles que
tirassem a tendinha porque eu tenho pavor, medo de ficar em um
lugar escuro. Aí eles puseram um
colchonete fora (da tenda) e eu fiquei o tempo todo deitado, sem
poder me mexer. Não estava
amarrado."
OS SEQUESTRADORES - "Me
pegaram três (homens), mas eles
disseram que havia mais 15 lá fora,
tudo de metralhadora, viu? Tudo
mascarado. Alguém alguma vez
ouviu falar de Primo Carmela
(campeão mundial dos pesos-pesados em 1933), que foi campeão
de boxe da Itália? Era um daquele
tipo, eu acho que tinha uns 2 metros e tanto. Só de olhar o tamanho
dele apavorava. Eles disseram que
eram profissionais. Agora, eu quero dar um parecer favorável a eles,
porque eles foram gentis comigo.
Eu acho que eles respeitaram minha idade de 80 e tantos anos e não
me bateram, não fizeram nada de
maldade."
NEGOCIAÇÃO - "Eu devo tudo
pro meu filho, viu? Meu filho começou a negociar com eles e negociou, negociou. Eles queriam US$
2 milhões, depois foram baixando,
foram baixando, porque viram a
minha situação, contei a eles minha vida. Eu fui jornaleiro, meu
pai morreu quando eu tinha 13
anos de idade. Eu tive que vender
jornal, eu vendia 50 jornais por dia
para ganhar 400 réis, para minha
mãe comprar polenta. Só tinha
polenta na minha casa e um pouco
de leite de cabra. Aí, talvez, eles tenham ficado compadecidos de
mim, um pouquinho."
LIBERTAÇÃO - "Eles me deixaram no km 27 da Castelo Branco,
estava chovendo, e eles me disseram: "Olha, não olha para trás. Se
você olhar para trás, você é um
homem morto, e ninguém vai saber nem quem te matou. Você faz
o seguinte. Depois de 5 minutos,
você vai para a esquerda que tem
um posto de gasolina Castelão.'"
COMIDA - "Eles traziam um
prato de pão. Nunca comi um pão
tão gostoso na minha vida. Era
pão de centeio. Às vezes, me davam com queijo. Eu também tomei iogurte."
COTIDIANO - "(Fiquei) quinze
dias sem tomar banho. Eu fedia,
ouviu? E, o pior de tudo, me deram uma garrafa de Coca-Cola, e o
gargalo era muito pequeno, eu
queria fazer xixi, mas me sujei,
viu? Tinha uma lata nojenta, asquerosa, fedida, que eu também
usava. Que banheiro, que banho,
nada. Eles fizeram tudo isso para
me assustar."
SEDATIVOS - "Eles me deram
um (leite) Parmalat, eu acho que
eles colocaram um sedativo, porque eu tomava o Parmalat e imediatamente perdia a noção de tudo. Eu dormia o tempo todo, acho
que eles punham dose de cavalo."
MEDO - "Medo? Nem me fala o
que é medo, porque é um pavor
tremendo, coisa medonha. Meu
maior medo era de que acontecesse alguma coisa com meu raptor,
porque, se ele não aparecesse, eu
ia morrer de fome, porque ninguém ia me dar comida. E eu só
sabia rezar a Ave Maria."
FAMÍLIA - "A minha salvação
foi que eu só pensava na minha
mulher, viu, na minha esposa, que
ela ia ficar desamparada, porque
eu estou passando por uma fase
muito ruim na minha vida, por
causa dos (empreendimentos) gigantes que estão surgindo no mercado financeiro e de eletrodomésticos. Acho que vão ficar poucos,
na verdade."
A VOLTA - (Quando reencontrou a mulher) "Ah, meu Deus,
Olha... nem fala, eu chorava de
alegria."
O FUTURO - "Nunca me aconteceu nada, mas, de hoje em diante,
em vez de chegar às 5h20 ... porque
tem um caminhão que chega de
manhã cedo para levar as notas
fiscais para eu poder entregar (a
mercadoria), porque a coisa não
anda boa para o meu lado. Eu vou
fazer o seguinte. Vou sair às 6h30,
que já é claro, e vou pedir para
dois guardas que trabalham dentro da loja para virem me buscar."
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