São Paulo, sábado, 03 de fevereiro de 2007

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WALTER CENEVIVA

Maior inimigo é o velho Bill


Promotores, advogados, juízes e procuradores do poder público deveriam conduzir-se de uma maneira harmônica


PARA OS profissionais do direito, a última semana de janeiro marca o início formal e solene das ações culturais, profissionais e judiciárias do ano. É o caso da posse, em Brasília, do novo presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o sergipano César Brito, da instalação do ano judiciário nos tribunais e assim por diante.
A semelhança de andamento é um dos modos que me inspira a escrever que esses profissionais -juízes, promotores, advogados e procuradores do poder público- são irmãos da mesma obra. Deveriam conduzir-se harmonicamente, mas vivem "brigando" entre si.
Tomo o exemplo da muito noticiada lista de pessoas que agravaram advogados, produzida na OAB-SP, com a ameaça de impedir a reinscrição delas em seus quadros, conforme poderá acontecer com juízes e promotores, entre outros, que suspendem sua inscrição para poder iniciar a atividade pública. O desagravo público é direito e não um luxo corporativo. Pode ser pedido e concedido quando o advogado é "ofendido no exercício profissional ou em razão dele" (Lei n. 8.906/ 94, artigo 7º, inciso XVII); o artigo 7º e seu inciso mencionado permitem a instauração de processo de desagravo, no qual a instituição constata se houve ofensa vinculada direta ou indiretamente ao exercício da profissão. Concedido, impõe manifestação pública da entidade em favor de seu inscrito.
A concessão ou negativa do desagravo é unilateral e depende do exclusivo juízo da entidade, ao avaliar o sentimento do ofendido. A sensibilidade para o agravo varia de pessoa a pessoa, justificando-se o "filtro" da Ordem, no admitir ou negar a existência da ofensa. A lista anunciada é coisa diversa. Coletiviza a publicidade, desligada dos imediatos agravos reconhecidos. Nem a lei nem o regulamento a prevêem. Também não a proíbem. Isso explica porque não há uniformidade no procedimento (destinado especificamente a condutas individuais, apreciadas individualmente).
A reação dos "inimigos" teve um amplo espectro: foi da indiferença à propositura de ações. Foi uma resposta constitucional, porque o inciso XXXV do artigo 5º afirma: "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaças de lesão a direito".
O episódio tem um lado muito mais preocupante, por ser crescente o número de advogados que demonstra irritação contra juízes. O oposto seria ideal, com advogados, juízes e promotores unidos pelo superior interesse comum no fazer justiça, tarefa em que são praticantes do direito para o mesmo fim, integrados na ação social de todos. Não é o que ocorre. Todos gritam e ninguém tem razão.
Volto ao começo. O problema não será resolvido com a lista nem com as reações que provocou. Se fosse caso de arrolar inimigos, caberia lembrar aos críticos da advocacia, pela undécima vez, o velho Bill. Numa de suas peças, quando dois personagens querem resolver os problemas do reino, um deles sugere: "Em primeiro lugar matemos todos os advogados!" Reconhecendo a repetição monótona, quem poderia ser maior inimigo que o dramaturgo inglês William Shakespeare (1564-1616), autor da frase? Aliás, há referências históricas de que ele foi advogado. Um dos nossos.


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