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MOACYR SCLIAR
Cerveja, Carnaval e máquina de lavar
Padre alemão fabrica cerveja em
máquina de lavar roupa. Michael
Fey, 45, padre da cidade de Duisburg, teve a idéia de usar a sua máquina de lavar roupa a fim de produzir cerveja mais barata para reuniões de jovens que organiza. "Tudo
o que precisava era algo que pudesse
ser usado para aquecer e misturar
-então por que não uma máquina
de lavar?", disse Fey. A máquina produz 20 litros de cerveja em dez horas.
Mundo Online, 25.fev.2003
Aquele seguramente seria o
Carnaval mais triste de sua
vida. Recém-separado da mulher,
desempregado, sem amigos, não
tinha onde ir, não sabia o que fazer. A única coisa que poderia
ajudá-lo naqueles dias era a cerveja, tradicional consolo dos solitários. Mas o dinheiro estava tão
escasso que nem a isso poderia
recorrer.
Foi então que leu no jornal a
notícia acerca do padre que, na
Alemanha, fazia cerveja na sua
máquina de lavar roupa. Intrigado, ligou para um amigo que trabalhara em cervejaria e que confirmou: sim, era muito fácil. Era
só arranjar os ingredientes e, naturalmente, a máquina de lavar.
Máquina de lavar ele tinha:
uma das poucas coisas que a mulher deixara no apartamento,
quando da separação. Os ingredientes, ele os comprou gastando
seus últimos reais. E, seguindo as
instruções do amigo, dispôs-se a
preparar sua própria cerveja. Foi
um processo relativamente lento;
ao cabo de várias horas ele tinha
na máquina um líquido amarelo
que parecia cerveja e cheirava a
cerveja. Provou: era cerveja, e da
melhor. A AmBev que se prepare,
gritou exultante, e passou o resto
da noite enchendo a cara.
Ao terminar, uma dúvida lhe
ocorreu: estaria a máquina ainda
funcionando? Para testá-la, jogou
ali a roupa suja das últimas semanas, que não era pouca. A brava máquina cumpriu sua missão:
lavou a roupa toda. Ele pendurou-a na área de serviço e, meio
tonto, foi dormir.
Acordou, horas depois, com um
barulho estranho vindo da área
de serviço. Seria um ladrão? Levantou-se, e ainda cambaleando,
foi até lá. O que viu fê-lo arregalar
os olhos.
As roupas tinham organizado
um verdadeiro Carnaval. Ali estavam: as bermudas pulando como malucas, as camisas dançando agarradinhas. As meias, vários
pares, haviam formado um verdadeiro bloco e desfilavam pela
área, dando um verdadeiro show
de samba, ao som da música que
saía, claro, da máquina de lavar.
Ou seja: as roupas estavam bêbadas. E, pior, jogaram-se nele, começaram a arrastá-lo, querendo
que ele sambasse também...
Com um berro, acordou. Tinha
sido um sonho, naturalmente: na
área de serviço, as roupas continuavam na corda, secando pacificamente. A máquina ainda cheirava a cerveja, mas estava quieta.
Quanto a ele, jurou que nunca
mais fabricará cerveja em casa.
Ou, se o fizer, usará uma máquina de lavar comprada especialmente para esse fim.
O escritor Moacyr Scliar escreve às segundas-feiras, nesta coluna, um texto de
ficção baseado em matérias publicadas
no jornal.
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