|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
SAÚDE
Medida será anunciada na terça, mas já gera polêmica entre especialistas, que questionam viabilidade do programa
SUS vai oferecer fertilização a soropositivos
CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL
A proposta do governo federal
de oferecer tratamento de reprodução assistida na rede SUS a casais soropositivos e sorodiscordantes (quando apenas um possui o vírus da Aids) cria polêmica
antes mesmo de sair do papel. Se
por um lado há o direito à reprodução garantido pela Constituição, por outro questiona-se o custo e a viabilidade desse serviço no
sistema público de saúde.
O projeto é parte da Política de
Direitos Sexuais Reprodutivos,
que será lançada pelo ministro
Humberto Costa (Saúde) na terça, Dia Internacional da Mulher.
Entre as propostas, está a criação de 26 centros de reprodução
assistida para casais inférteis. Seis
desses centros serão destinados
aos portadores do vírus da Aids.
Na avaliação do infectologista
David Uip, há outras medidas
mais urgentes no Programa Nacional de DST (doenças sexualmente transmissíveis)/Aids. Ele
também cita o controle da epidemia os programas de prevenção à
Aids, a produção de matéria-prima para a fabricação dos anti-retrovirais e as pesquisas em busca
de novas moléculas.
Outro problema, segundo o infectologista, é o governo não ter
idéia da demanda para o procedimento devido à subnotificação
dos casos. "Se a porta [de acesso à
reprodução assistida] for aberta,
todos terão direito. Não sabemos
se são 5.000 ou 500 mil."
O Brasil tem hoje 362,4 mil soropositivos. Estima-se que existam outras 300 mil pessoas convivendo com o vírus HIV sem saber. Para o governo, o projeto não
inviabiliza outros investimentos.
Técnica cara
A técnica de reprodução usada
para os homens soropositivos que
desejam ser pais é a mais cara da
reprodução assistida. Nas clínicas
particulares, chega a custar R$ 18
mil por tentativa -quatro vezes
mais que uma inseminação artificial. As chances de gravidez por
tentativa são, em média, de 35%.
No Brasil, há ao menos dez clínicas privadas que oferecem o
tratamento, a R$ 18 mil por tentativa. Na rede pública, há quatro
centros, mas o casal precisa comprar os remédios, de R$ 5.000.
Segundo Agnaldo Cedenho, do
serviço de reprodução da Unifesp, o homem precisa estar com a
carga viral indetectável. Ele explica que o sêmen passa por uma
"lavagem" porque os fragmentos
de DNA do vírus HIV podem ficar nos espermatozóides.
Para mulheres soropositivas,
não existe técnica segura. Edson
Borges, especialista em reprodução assistida, afirma que, durante
a gravidez, existe uma comunicação entre a placenta e o feto, situação que favorece a contaminação.
Nesses casos, a solução seria
uma inseminação (espermatozóides, depois de selecionados, são
colocados no útero) seguida de
procedimentos que já ocorrem
em casos de gravidez natural de
soropositivas, como a administração de coquetel anti-retroviral,
dose adicional de AZT durante o
parto e nas primeiras semanas de
vida do bebê e o não-aleitamento.
Com isso, o risco de a criança se
tornar soropositiva é de 2%.
A médica Wilza Villela, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, preocupa-se com a interação
entre os hormônios utilizados no
tratamento de reprodução assistida e os medicamentos anti-retrovirais (que reduzem a expansão
da infecção dentro do corpo), que
podem potencializar os efeitos colaterais (como a vasoconstrição e
o aumento da pressão arterial).
De acordo com Cedenho, o casal deve ser informado de que,
embora o risco seja mínimo, a
contaminação pode ocorrer também durante uma gravidez por
reprodução assistida.
"Quando eles [soropositivos]
decidem ter um filho, estão dispostos a correr qualquer risco.
Então, que seja o menor possível",
afirma a advogada Beatriz Pacheco, do Movimento Nacional de
Cidadãs Posithivas.
Texto Anterior: Há 50 anos Próximo Texto: Ter filhos é um direito legítimo, diz ministério Índice
|