|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
PASQUALE CIPRO NETO
Em tempos de destruição...
"Da força da grana que
ergue e destrói coisas belas..." Quem não se lembra desse
trecho de "Sampa", de Caetano
Veloso? Pois bem, já vi -inúmeras vezes- esse trecho da canção
estampado em camisetas, muitas
delas com "destroe" ou "destróe"
no lugar de "destrói".
A grafia da terminação de formas verbais como essa é padronizada: "mói" (de "moer"), "rói"
(de "roer"), "dói" (de "doer"),
"constrói" (de "construir"), "destrói" (de "destruir"), entre outras,
terminam em "oi", com "i" e com
acento agudo no "o".
O agudo se deve a uma regrinha
simples: acentua-se a base tônica
dos ditongos abertos "ei", "eu" e
"oi", o que se vê em palavras como "céu", "escarcéu", "ilhéu",
"assembléia", "anéis", "idéia",
"apóia", "heróico", "estóico" etc.
O fato de muita gente se confundir e grafar essas formas verbais com "e" em vez de "i" é facilmente explicável (e compreensível): a terceira pessoa do singular
do presente do indicativo dos verbos terminados em "er" ou "ir"
quase sempre é feita com "e" ("bebe", de "beber", "sofre", de "sofrer", "permite", de "permitir",
"consegue", de "conseguir", etc.).
Moral da história: levadas por
esse fato, as pessoas acabam seguindo um "sistema", que, na
verdade, não funciona em 100%
dos casos. Posto isso, não custa insistir em que, conhecida a raiz do
problema, não se morre por seguir a grafia que se convenciona
como padrão: "destrói", "rói" etc.
Pois bem, por falar no verbo
"destruir", veja esta deliciosa
mensagem, enviada pela leitora
Ana Maria A. Pluciennik: "O corretor ortográfico do "Word" conjuga o verbo "destruir" na terceira
do plural do presente do indicativo com a forma "destruem". O "Dicionário Larousse Cultural" confirma essa forma, enquanto outra
obra usa "destroem". Qual forma
devo usar em minha tese de doutorado? Devo perguntar ao Bush,
que é um renomado especialista
em destruição?".
Cara Ana, suponho que Bush
entenda muito de bombas, mas
não dos tormentos da nossa língua. O fato é que "destruir",
"construir" e derivados são verbos abundantes, ou seja, apresentam mais de uma forma para determinadas flexões. No Brasil, as
formas mais usadas são "destrói",
"constrói", "destroem" e "constroem". O emprego das formas regulares ("destrui", "destruem",
"construi" e "construem") é mais
comum em Portugal.
Não estranhe o que afirmei no
parágrafo anterior ("formas regulares"). Sim, "destrui" (que se lê
"destrúi") e "destruem" são regulares, enquanto "destrói" e "destroem" são irregulares.
"Regular" e "irregular" aqui
nada têm que ver com "certo" e
"errado". Trata-se apenas do conceito de regularidade verbal. Se o
verbo é "destruir" (com "u" antes
de "-ir"), a forma regular (fiel ao
radical) é "destrui" (insisto: lê-se
"destrúi"). "Destrói" (em que o
"u" do radical dá vez ao "o") é
forma irregular -e corretíssima.
Essa história de (ir)regularidade mostra mais uma vez a importância do fator uso em língua. O
que é regular ("destrui", "construi") nos parece estranho. Por
quê? Porque não usamos.
Em tempo: se sua tese é para
uma universidade brasileira, use
"destroem", cara Ana. E mande
passear seu "Word". É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras
E-mail - inculta@uol.com.br
Texto Anterior: Aeroporto de Guarulhos divulga aviso Próximo Texto: Trânsito: Saiba como evitar trecho da Radial Leste Índice
|