São Paulo, sexta, 3 de abril de 1998

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OPINIÃO
Violência nas prisões

RENATO SIMÕES

As denúncias de espancamento e tortura contra presos da carceragem do Depatri (Departamento de Investigação de Crimes Patrimoniais de São Paulo), feitas no começo de fevereiro pela Pastoral Carcerária e pela Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa, podem se transformar num marco para a luta contra a violência cotidiana nas prisões.
A firme determinação demonstrada pela Secretaria da Segurança Pública em apurar o caso, que esperamos não seja prejudicada com as mudanças na Corregedoria da Polícia Civil, está permitindo a produção de provas que não só confirmam a veracidade das denúncias dos presos como definem a responsabilidade dos policiais civis, entre eles alguns delegados, nessas sessões de espancamento.
Dos 130 casos apresentados pelas entidades, perícias confirmaram marcas de agressão por objetos contundentes em 107 presos.
Os depoimentos colhidos pela Corregedoria indicam que policiais civis cometeram toda sorte de brutalidades contra os presos, que, nus, eram retirados de suas celas para apanhar em corredores poloneses, com socos, pontapés e golpes de cassetete, barras de ferro ou canos de arma de fogo.
O desmonte da versão de suicídio para a morte do preso Otávio dos Santos Filho, ocorrida no Depatri em outubro de 1997, acrescenta elementos de convicção à tese de que a violência contra os presos daquela unidade decorre da institucionalização de um método truculento de obtenção de disciplina em distritos superlotados.
Devemos refletir seriamente sobre esse modelo, que tem por fim exclusivo da pena a punição dos que cometem crimes, sem nenhuma preocupação com sua ressocialização e seu retorno produtivo ao convívio social. Ele é ineficiente, caro para o contribuinte -que paga para ter a ilusão de proteção do Estado- e indigno para os que pagam com a privação de liberdade suas dívidas com a sociedade.
Em geral, o resultado dessa espiral de violência é o fortalecimento da criminalidade: quem passa por essas instituições penais degradadas sai delas pior do que entrou.
É urgente avançar na instituição de penas alternativas para réus primários de crimes de baixa intensidade; na proibição efetiva do uso de distritos para a guarda de condenados; numa nova política penitenciária, que, baseada em trabalho e educação, dê novas oportunidades àqueles que enveredaram pelo caminho do crime e que devem ter, por parte do Estado, o convite a uma nova vida e ao respeito aos direitos da cidadania.
A identificação de responsáveis por crimes bárbaros como os cometidos no Depatri será a garantia de que a impunidade não ajudará a perpetuar um modelo falido.


Renato Simões, 36, formado em filosofia pela PUC de Campinas, é deputado estadual pelo PT-SP e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa



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