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São Paulo, sábado, 03 de maio de 2003

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Perigo continua mesmo após acidente

DA REPORTAGEM LOCAL

Um carro dá um cavalo-de-pau e sai em disparada. Por sorte, não atinge as crianças que andam e passeiam de bicicleta pela rua estreita e de calçadas irregulares.
À distância, alguns moradores gritam em protesto. A manobra arriscada até poderia passar despercebida em outra época se não tivesse ocorrido cinco dias depois do acidente que matou um garoto, feriu outro e terminou no linchamento do motorista.
O cavalo-de-pau ocorreu às 16h de anteontem, a 100 metros da calçada onde as duas crianças estavam quando foram atingidas.
No bar, a manobra arriscada e a semana sem sinal do poder público são apontadas pelos moradores como um aviso de que nada vai mudar no Parque Grajaú.
"Aqui é um bairro esquecido. A criança fica na rua porque não tem onde brincar. Não temos lazer, não temos nada", disse a moradora Márcia Regina da Silva, 38.
Para especialistas, essa descrença é o ponto de partida para tentar explicar a prática de linchamento. "O linchamento não pode ser analisado só como um ato de barbárie. Como ato de justiça popular, ele expressa o conflito entre a expectativa da população e o funcionamento das instituições da Justiça", afirmou a socióloga Jacqueline Sinhoretto.
Para a auxiliar de enfermagem Maria Lopes, 48, a terceira moradora da área, a descrença no poder público vem desde o final da década de 70. O Parque Grajaú nasceu da invasão de uma área municipal. "Água, luz, esgoto, foi tudo uma luta", disse.
Duas décadas depois do começo da invasão, veio o asfalto, depois o trânsito, atropelamentos e as lombadas clandestinas feitas pelo população.
As cinco lombadas da rua, segundo moradores, foram retiradas pela prefeitura. A Companhia de Engenharia do Tráfego negou o pedido de lombada oficial alegando falta de fluxo de veículos.
A convivência arriscada entre crianças e motoristas também gerou outros episódios de violência. Um ano atrás, a discussão entre um motorista que reclamou dos garotos jogando bola na rua e um morador acabou em tiroteio a 20 metros do local do acidente do último sábado. O morador levou cinco tiros, mas sobreviveu.


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