UOL


São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

URBANISMO

Recursos públicos e privados podem acabar com degradação do local

Força da grana volta para o centro de SP

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

O centro de São Paulo vai ganhar um oásis azul a mais de quarenta metros do chão. Uma piscina suspensa por vigas de aço será construída sobre o 12º andar do prédio onde funcionava a Mesbla, na esquina da ruas 24 de Maio e Dom José Gaspar. Com vista para o Teatro Municipal, a piscina será o ponto culminante do projeto que Paulo Mendes da Rocha fez para o prédio onde funcionará um novo Sesc em 2005.
Um Sesc criado por Mendes da Rocha, um dos principais arquitetos do país, não é a única boa nova para o centro paulistano vinda da iniciativa privada. Outros quatro prédios de porte estão sendo restaurados ou construídos na região. Os investimentos nos cinco projetos atingem R$ 115 milhões.
Os recursos públicos são mais vultosos. Neste mês, a prefeitura assinará um acordo com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), pelo qual receberá um empréstimo de US$ 100 milhões para o centro, mas terá que investir US$ 68 milhões -a soma chega a R$ 504 milhões.
O círculo de boas notícias para uma região que só conhecia degradação e esvaziamento se fecha com o anúncio do governador Geraldo Alckmin (PSDB), na quinta-feira, da compra de oito prédios para a instalação de secretarias estaduais. Marta Suplicy (PT) já decidira transferir a prefeitura para o viaduto do Chá.
Os investimentos privados no centro são um sinal de que a região não é mais uma promessa, segundo Marcos Barreto, 34, diretor da Emurb (Empresa Municipal de Urbanização). "É a prova de que a reabilitação está dando certo."
A aposta mais elevada na região central é a do ex-governador Orestes Quércia. Ele restaurou o prédio que já foi do hotel Jaraguá e dos jornais "Diário Popular" e "O Estado de S. Paulo" e reabrirá em novembro um hotel com o mesmo nome. Ele investiu cerca de R$ 40 milhões num hotel quatro estrelas, o Holliday Inn Select, com 417 apartamentos, teatro, restaurante e centro de convenções para 3.000 pessoas.
"Todos os centros de cidade do mundo estão sendo recuperados e aqui acontecerá a mesma coisa. Em quatro, cinco anos essa região vai estar completamente mudada", aposta Quércia, 64.
O prédio, cuja fachada é tombada pelo Patrimônio Histórico, foi projetado por dois arquitetos de renome: o francês Jacques Pilon (que projetou a biblioteca Mário de Andrade) e o alemão Franz Heep (que trabalhou com Le Corbusier em Paris).
Como o prédio abrigou dois jornais, Quércia vai prestar tributo a empresários da mídia dando seus nomes a 32 salas de convenções. Serão homenageados, entre outros, Roberto Marinho, da Globo, Julio Mesquita, de "O Estado de S. Paulo", e Octavio Frias de Oliveira, publisher da Folha.
A maior ousadia do arquiteto que cuidou do restauro, Miguel Juliano, foi abrir uma rua dentro do hotel para facilitar o fluxo de hóspedes. "Quem não está atrás de status irá para o centro", diz Juliano, 74. "O preço do aluguel é até vinte vezes mais barato do que nos Jardins ou na região da marginal Pinheiros."
A abertura para a cidade é uma marca comum aos novos projetos. O Sesc 24 de Maio que Paulo Mendes da Rocha criou, por exemplo, é tão integrado à rua que até os cartazes com ofertas de emprego que são colados nas antigas vitrines da Mesbla serão preservados, só que por meio de painéis eletrônicos. A entrada em vidro não cria um limite claro entre a rua e o espaço interno.
"A idéia do projeto é fazer o máximo possível de elogio à população que trabalha no comércio. É uma visão de festa na cidade, de encontros em clima de alegria", diz o arquiteto. "Com o metrô, virou programa a periferia vir para o centro. É a abertura, como se diz em ópera, para novos tempos."
Para o Sesc, o prédio tem um caráter reparador, também. A entidade foi fundada no centro, na rua Florêncio de Abreu, em 1946 e abriu outra unidade na rua do Carmo em 1960. Mas acabou dando as costas para a região: dos 13 Sescs existentes na cidade, justamente os menores ficam na área.
"O Sesc ficou defasado no centro", diz Danilo Santos de Miranda, 60, diretor regional da entidade. "A cidade não pode permitir que essa região seja deteriorada como se fosse terra de ninguém. O Sesc sempre ajudou a combater isso, mas suas unidades no centro ficaram antigas."
Por isso, serão construídas não só uma, mas duas unidade na região central: além do Sesc 24 de Maio, haverá outro na alameda Dino Bueno, em Campos Elíseos, perto da Sala São Paulo.
O mais radical dos projetos de abertura para o espaço público é o novo Centro Universitário Maria Antonia. Entre dois dos prédios da rua onde a USP funcionou entre 1949 e 1968, será criada uma praça pública, que servirá de porta de entrada ao centro cultural.
"A idéia é oferecer alguma coisa para a cidade, uma experiência urbana diferente dos muros e das cerquinhas, e mostrar a cidade como uma experiência positiva", diz Fábio Valentim, 33, um dos autores do projeto.
Dos prédios antigos, só sobrará a fachada após o final da obra, prevista para acabar em agosto do próximo ano. O centro ganhará novas salas de exposições, teatro, sala de concerto, oficinas para workshops e reserva técnica para obras de arte.
A recriação do espaço só foi possível por causa de um novo tipo de engenharia financeira. Dos R$ 4 milhões previstos para a obra, a USP só deu até agora R$ 100 mil -o restante deverá vir da iniciativa privada.
Um acordo entre o centro e o Instituto de Arte Contemporânea, que detém o acervo do escultor Sergio Camargo (1930-1990), garantiu à obra R$ 1 milhão. Em troca, o IAC usará um dos prédios por cinco anos. A Gafisa já deu R$ 600 mil e promete mais R$ 400 mil. A W/Brasil entrou com serviços -criou a programação visual. Fabricantes de cimento, aço e de elevadores estão negociando a sua participação na obra.
Lorenzo Mammì, 46, diretor cultural do centro, diz que sem a participação da iniciativa privada, seria "impossível" recuperar o prédio. A USP dá só R$ 250 mil por ano à Maria Antonia.


Texto Anterior: Entrevista: Justiça "vê dignidade como direito"
Próximo Texto: Infância: Febem tem 90 dias para diminuir lotação em unidade de São Paulo
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.