São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2008

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Especialistas apontam riscos da auto-ajuda

Dicas dadas por livros e programas, com tom de verdade, não devem ser seguidas cegamente, advertem os médicos

Facilidade das respostas prontas pode criar pessoas dependentes da auto-ajuda; dicas analisadas com visão crítica, porém, podem ajudar


DA REPORTAGEM LOCAL

Apesar do freqüente tom de verdade universal, as dicas dadas por livros e programas de auto-ajuda não devem ser seguidas cegamente, advertem especialistas.
Primeiro, porque o problema específico do leitor ou do espectador, mesmo tendo semelhanças, pode não ser bem aquele que está sendo usado de exemplo para a lição. Depois, porque há muita bobagem sendo vendida como auto-ajuda.
É particularmente arriscado seguir as orientações de livros e sites feitos para quem deseja perder peso sem ter o trabalho de se consultar com um médico ou um nutricionista.
"Não vou dar nome de livro, mas existem por aí coisas absurdas associando perda de peso ao grupo sangüíneo ou às cores dos alimentos. Já li sobre a dieta de Jesus, em que a pessoa só come os alimentos citados na "Bíblia", sobre a dieta em que é proibido misturar frango e arroz e sobre uma que manda comer abacaxi o dia inteiro", enumera o médico Marcio Mancini, presidente da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica) e um dos diretores da Sociedade Brasileira de Metabologia e Endocrinologia.
De acordo com Mancini, a pessoa que segue essas dietas corre o sério risco de cortar alimentos que contêm nutrientes essenciais para a saúde.
"Quem se abstém de comer carne pode ter deficiência de vitamina B12, que é muito importante para o funcionamento cerebral. Quem deixa de consumir o leite e seus derivados pode ter deficiência de cálcio, e o organismo acaba retirando o cálcio dos próprios ossos", ele exemplifica.

Agressividade
Tentar repetir as técnicas de adestramento ensinadas pelo programa televisivo "Ou Eu ou o Cachorro", do canal GNT, pode ser igualmente perigoso.
"Lidar com a agressividade do cachorro é complicado", avisa Paulo Salzo, veterinário e professor das universidades Metodista e Bandeirante, de São Paulo. "A agressividade do cachorro pode se virar contra as pessoas da própria casa."
Para a psicóloga e colunista da Folha Rosely Sayão, a facilidade das respostas prontas pode deixar as pessoas dependentes da auto-ajuda. Diante de uma dúvida, fica mais fácil recorrer ao manual do que pensar numa solução. "O meu receio é que as pessoas não reflitam, que não tenham um pensamento crítico", ela diz.
Com uma visão crítica, afirmam os especialistas, a auto-ajuda pode ajudar. "Você tem que ver o que se aplica ao seu caso e descartar todo o resto", afirma a a psicóloga Dora Lorch, autora do livro "Como Educar sem Violência" (ed. Summus).

Clichês
Adversários da auto-ajuda dizem que livros como "Casais Inteligentes" só falam obviedades e advogam clichês.
O leitorado de livros do estilo "Casais Inteligentes Enriquecem Juntos" -há mais de dois anos na lista dos mais vendidos- discorda.
"Clichê? Como clichê se uma das máximas do livro é: "Entre comprar uma casa à vista e alugar outra de mesmo valor, é melhor alugar'", pergunta a instrumentadora cirúrgica Cláudia Pereira Terra, 37.
Sem o impulso de resenhas favoráveis dos cadernos literários, a auto-ajuda vive principalmente do boca-a-boca feito pelos leitores satisfeitos. Um lê, indica para o outro, para o outro e para o outro. "Vende é porque funciona", defende Cláudia.
Vem do decano da auto-ajuda no Brasil, Lair Ribeiro, autor do já clássico "O Sucesso não Ocorre por Acaso", de 1992, a advertência: "Ao contrário do que muita gente imagina, a auto-ajuda não substitui o médico, o terapeuta, o psicólogo, ou o especialista".
Ribeiro admite que o segmento "ainda está cheio de aventureiros". E ele dá sua explicação: "Para ser engenheiro, precisa ter cursado engenharia. Para ser médico, precisa ter feito medicina. Para escrever livro de auto-ajuda, não precisa nada. Só uma editora."
De acordo com Lair Ribeiro, que é médico, "tem gente que anda de ônibus, e não por opção", escrevendo sobre como ficar rico. "É piada", diz. Para ele, é preciso informar-se sobre o livro com quem já o leu e tentar obter referências sobre o autor. (RICARDO WESTIN e LAURA CAPRIGLIONE)


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