São Paulo, domingo, 04 de março de 2001

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VIOLÊNCIA
Maioria dos roubos e furtos da capital paulista é cometida por jovens brancos, segundo estudo com 2.901 processos
Pesquisa revela perfil do ladrão em SP

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O assaltante típico que atemoriza São Paulo não é negro nem nordestino, como fazem supor dois preconceitos bem arraigados na sociedade.
Uma pesquisa inédita feita no Judiciário, obtida com exclusividade pela Folha, revela que 57% dos crimes de roubo e furto são cometidos por brancos (os negros respondem por apenas 12%).
Desses delitos, 62% são praticados por paulistas, percentual que sobe para 71% se forem somados os crimes realizados no município de São Paulo por mineiros (5%) e paranaenses (4%). A Bahia responde por 8% dos envolvidos, e Pernambuco, por 6%.
"O Perfil do Réu nos Delitos contra o Patrimônio" é o primeiro levantamento do gênero, feito a partir de consulta direta de processos no Tribunal de Alçada Criminal (TACrim).
O retrato obtido pela pesquisa -realizada pelo Cebepej (Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais)- ajuda a entender o caldeirão em que se transformou o sistema penitenciário paulista.
Quase a metade dos delitos contra o patrimônio são cometidos por jovens, na faixa de 18 a 21 anos. Apenas 25% dos acusados por furto, e 15% por roubo, têm mais de 30 anos. Pouco mais da metade dos acusados declararam-se reincidentes.
"É comum encontrar jovens de 20 anos acumulando penas em torno de 40 anos", diz o juiz Caetano Lagrasta Neto, do TACrim, e secretário-executivo do Cebepej.
Uma vez encarcerado, por um primeiro delito, dificilmente o jovem voltará a uma vida normal, diz o magistrado.
"A pesquisa mostra aos juízes que é desnecessário, de certa forma, encarcerar imediatamente o ladrãozinho que roubou um relógio, colocando-o em regime fechado", diz Lagrasta Neto.
"Isso nos levou ao PCC (Primeiro Comando da Capital, organização de presos que domina os presídios paulistas)", diz o juiz.

Abertura do Judiciário
Durante seis meses, 22 alunos da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo) consultaram 2.901 processos que deram entrada, entre 1991 e 1999, em 29 varas criminais do foro central da capital.
A amostra é estatisticamente representativa, pois alcança 5% dos 57.997 processos do período: 17.220 por furto e 40.777 por roubo (ao contrário do furto, o roubo é a apropriação feita com ameaça grave ou com o uso de violência).
A abertura dos arquivos da Justiça se deve à iniciativa do Cebepej, entidade que reúne juízes e estudiosos sobre o Judiciário, presidida pelo desembargador aposentado Kazuo Watanabe.
A pesquisa teve o apoio do Idesp (Instituto de Estudos Econômicos, Sociais e Políticos de São Paulo), do TACrim e da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo.
"Há cinco anos, não haveria condições para um trabalho científico aproximando a academia e o Judiciário", diz Maria Tereza Sadek, professora de ciência política na USP e pesquisadora do Idesp.
Das 30 varas criminais da capital paulista, apenas o juiz titular da 4ª Vara recusou-se a colaborar, proibindo o ingresso dos pesquisadores no cartório.
Os resultados da pesquisa serão apresentados nesta terça-feira, às 17h, no Plenário do Tribunal de Alçada Criminal. Para debater o tema, foram convidados, entre outros, juristas, secretários e ex-titulares das pastas de Justiça e Segurança Pública.



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