São Paulo, domingo, 04 de março de 2007

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Núcleo em São Carlos prioriza a tolerância

LUÍS FERNANDO MANZOLI
JULIANA COISSI

DA FOLHA RIBEIRÃO

São Carlos, cidade de 220 mil habitantes do interior paulista, criou há seis anos um núcleo com o objetivo de aplicar integralmente o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) no atendimento ao jovem infrator. Os resultados obtidos têm colocado a cidade como um exemplo no Estado.
Em 1998, três anos antes da instalação do NAI, 15 adolescentes de São Carlos cometeram homicídios. Em 2005, o número caiu para um e, em 2006, não houve nenhum caso.
Segundo o padre Agnaldo Lima, ex-coordenador do NAI e atual presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, a média de reincidência de jovens que cumprem medidas socioeducativas na cidade foi de 4% no ano passado - no Estado, 29% dos adolescentes atendidos no regime fechado e aberto voltaram a cometer um crime em 2006.
Em Americana, segunda cidade do Estado a inaugurar um NAI, em abril de 2005, a reincidência em 2006 foi de 20%.
Uma das estratégias do núcleo é usar tolerância em relação ao adolescente que comete um crime. Segundo o juiz da Infância e Juventude de São Carlos, João Galhardo, a cada semestre pelo menos 15 jovens que cometeram crimes graves e teriam de ser internados são enviados para medidas mais leves, como a semiliberdade.
No ano passado, dos 850 jovens infratores atendidos pelo núcleo, apenas nove (ou 1,05%) receberam punição máxima da Justiça prevista pelo ECA e foram enviados para unidades de internação. Para comparar, em Ribeirão Preto, que também tem um NAI, dos 903 adolescentes que cometeram atos infracionais de janeiro de 2006 até este mês, 177 jovens (19,6%) foram internados na Fundação Casa, antiga Febem.
"O que fazemos é olhar para o adolescente, e não para o ato infracional. Em vez de investirmos em baldes para conter a água, tentamos fechar a torneira", diz o padre Lima.
Enquanto espera a aplicação da punição, o jovem em São Carlos realiza atividades escolares, artísticas e esportivas, no espaço do próprio NAI.

Internação
Das seis medidas socioeducativas previstas pelo ECA, São Carlos só não tem a internação -executada, quando necessário, por unidades da Fundação Casa em Ribeirão, Araraquara ou São Paulo.
Também não há celas no NAI de São Carlos. O local reservado para a internação provisória do jovem que espera sentença judicial tem portas, e não grades como em outras cidades.
Para o sociólogo canadense Marc Le Blanc, referência no estudo mundial da delinqüência juvenil que esteve em Ribeirão na quinta passada, quanto menor a abordagem punitiva, maior a taxa de sucesso e, com o tempo, menor a delinqüência.
Umaia El Khatib, terapeuta ocupacional e professora da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), afirma que o modelo é um avanço em comparação com outros sistemas de atendimento ao adolescente infrator, mas ainda incorpora a "visão errônea" de que o adolescente infrator tem de ser punido em vez de educado.


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