São Paulo, Domingo, 04 de Abril de 1999
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DESFECHO
Câmara pode apontar um ou outro bode expiatório e enterrar o resto da investigação, diz cientista político
Só pressão popular pode evitar "pizza" na CPI

da Reportagem Local

Pressão popular. Essa é a receita para evitar que acabe "em pizza" a investigação da CPI sobre a cobrança de propinas na administração de São Paulo. Ou seja, para garantir que as irregularidades sejam investigadas, e os responsáveis, punidos.
Na opinião de vereadores, cientistas políticos e estudiosos do assunto, a apuração, embora tenha sido veloz até agora, tem pela frente obstáculos que só podem ser vencidos se surgirem "forças externas" à Câmara Municipal.
"Se não houver acompanhamento da população e pressão da imprensa, a Câmara tende a executar um ou outro bode expiatório e enterrar o resto da investigação", diz o cientista político Leôncio Martins Rodrigues.
O principal entrave à investigação é a composição política do Legislativo municipal: 35 vereadores (63% do total) participam do governo, principal foco de irregularidades. Muitos deles (29 vereadores, ou 53%) já controlaram administrações regionais, onde as denúncias não param de surgir.
Ou seja, com a CPI, a Câmara criou um grupo para investigar a atuação da maioria de seus integrantes. Mas essa maioria ainda detém o poder: o plenário é que vai decidir se aprova as conclusões da investigação da comissão.
A resistência dos vereadores que apóiam o Executivo já foi sentida em fevereiro, quando a criação da CPI foi adiada por um mês.
Naquela ocasião, foram "forças externas" que romperam o impasse, diz o cientista político Rui Tavares Maluf, que estuda os últimos 50 anos de história da Câmara.
"A CPI só foi finalmente aprovada quando a imprensa passou a publicar o nome, a foto e o telefone dos vereadores que votaram contra a investigação ou que não apareceram para votar. Os vereadores entraram em pânico", diz.
Outro obstáculo potencial é a resistência dentro da CPI. Afinal, três dos cinco vereadores que compõem a comissão apóiam o governo e já controlaram administrações regionais. São eles Milton Leite (PMDB) e Brasil Vita e Wadih Mutran (PPB).
Leite, que controlava a AR-Santo Amaro, é o relator das conclusões da CPI. É ele que vai dizer que irregularidades merecem punição pela Câmara (cassação de mandato e de direitos políticos).
Os demais membros da CPI, inclusive o presidente José Eduardo Martins Cardozo (PT), se não concordarem com Leite, podem fazer relatórios separados, mas estes não vão ser usados na Câmara.
A utilidade desses relatórios anexos é instruir eventuais ações na Justiça, já que serão enviados ao Ministério Público.
Leite, no entanto, descarta a idéia de pizza em seus relatórios. "Não é preciso fazer nada para evitar pizza. Basta esperar pelo meu relatório, vocês vão ver", disse ele, na semana passada, sobre as conclusões da investigação da AR-Penha.
A investigação da Penha, porém, é apenas a primeira de uma série que inclui pelo menos outras três administrações regionais: Sé, Itaquera e Pinheiros. E continuam a surgir denúncias. Pelo menos Lapa e Pirituba já estão na mira dos vereadores, além de outros serviços da prefeitura.
O volume de trabalho é o terceiro obstáculo importante, segundo o vereador José Eduardo Martins Cardozo (PT), presidente da CPI. Cardozo diz que já pediu auxílio à prefeitura para obter mais recursos, mas não recebeu nada. "Temo que tenha que ir à Justiça para conseguir mais pessoal."
(RODRIGO VERGARA)




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