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LETRAS JURÍDICAS
O Brasil em sobressalto
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
Em 1922 a Folha, recém-nascida, defendia o voto secreto em editorial. Oscar Pilagallo, em seu livro comemorativo
dos 80 anos do jornal, que tem o
mesmo título usado nesta coluna,
traz o fac-símile do texto publicado, defendendo a mudança da lei
para transformar o sufrágio popular em efetiva manifestação do
eleitor, fugindo da farsa dos pleitos da época.
Num país em que o número de
pessoas com mais de 50 anos de
idade vem crescendo, parte dos
fatos retratados na obra integrou
o dia-a-dia de muitos leitores. Fiquei surpreso ao encontrar inúmeras referências ao temário
constitucional no período histórico examinado. Aproveito o excelente trabalho e as pesquisas de
Pilagallo para anotar fatos do Direito (selecionando uns poucos,
como evidente) durante as lutas
do jornal octogenário.
Superado o movimento constitucionalista de 1932, que o jornal
defendeu, o governo de Getúlio
Vargas terminou constrangido a
aceitar a reconstitucionalização
do país. Veio a Constituição de
1934, de vida breve, como a Carta
alemã de Weimar, que lhe serviu
de modelo. Foi revogada em 1937
por Getúlio, passando todos os
poderes às mãos do ditador. Não
se negue, porém, que sob Getúlio
o Brasil superou a condição de
país essencialmente agrícola por
um processo de capacitação industrial, passo que a Segunda
Guerra Mundial (1939-1945)
mostrou ser imprescindível.
Pilagallo recorda a eleição do
marechal Eurico Gaspar Dutra,
sob a Constituição de 1946, essencialmente democrática, voltada
para o federalismo e para a descentralização, invertendo o modelo getulista. Dutra governou
com o "livrinho", jeito informal e
simplório de referir a Constituição, que parecia um modo de "fixar na sociedade a imagem de
um presidente legalista", nas palavras do autor. Jeito que, aliás,
fez escola.
A influência dos fatos externos,
permanente na vida brasileira,
foi substituída, nos tempos posteriores ao conflito mundial, pela
Guerra Fria, na bipolaridade dos
Estados Unidos e da União Soviética.
A criação da Companhia Siderúrgica Nacional, a instauração
do monopólio do petróleo (contra
a opinião da Folha, no entendimento de que o capital nacional
não era suficiente para a pesquisa
no país), o desenvolvimento industrial e a agropecuária diversificada foram marcos do progresso. Vargas foi deposto, voltou eleito pelo povo, mas se matou em
1954, envolvido em escândalos.
Em outros campos, ganhamos
duas Copas do Mundo de futebol
(58 e 62), e duas polegadas nos
quadris da baiana Marta Rocha
lhe tiraram o título no concurso
de Miss Universo. Apesar de algumas fraturas, o processo democrático foi mantido até 1964 sob a
Constituição de 1946, ressalvado
o período posterior à renúncia de
Jânio Quadros, com breve e malsucedida incursão pelo parlamentarismo.
Brasília, criação de Juscelino,
feita em grande parte pela indústria de São Paulo, nasceu em
1960. Jânio foi o primeiro presidente a se empossar na nova capital por escassos sete meses. Sua renúncia acabou levando ao movimento militar de 1964 e aos atos
institucionais que mantiveram
apenas a formalidade da Constituição de 46, pois a vontade do
poder predominava, tanto que
impôs a Carta de 1967, emendada
mais duramente em 69, somente
deixando de existir em 88. Foram
anos difíceis, de censura, de perseguições, de processos judiciais indevidos, até a restauração democrática. Daí por diante, são tempos de hoje. Pilagallo reconhece que a democracia está consolidada, mas não atingiu pleno amadurecimento. Para ele, "a história da democracia está apenas começando".
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