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SISTEMA PRISIONAL
Governo força "convívio" de inimigos desde o ano passado; críticos da medida temem novos massacres
Rio mistura facções em nove presídios
SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO
Oito penitenciárias e uma casa
de custódia do Rio misturam em
seus cárceres presos vinculados a
diferentes facções criminosas.
Com as novas ameaças de rebelião, há o risco de mais um massacre caso uma das facções domine
a prisão, como ocorreu neste fim
de semana na Casa de Custódia de
Benfica (zona norte).
Confinar inimigos em um mesmo presídio é uma política adotada desde o ano passado pela Secretaria de Administração Penitenciária. O objetivo, segundo o
secretário Astério Pereira dos
Santos, é mostrar que quem manda na prisão é o governo, não os
presos e suas facções.
Essa política foi confrontada
durante o motim em Benfica. Pelo
menos 30 presos foram mortos
quando os rebelados, do CV (Comando Vermelho), invadiram o
andar em que estavam os rivais
do TC (Terceiro Comando). Alguns cadáveres estavam queimados e mutilados.
As mais importantes facções
criminosas do Rio -CV e TC-
dividem, além da casa de custódia, as penitenciárias Bangu 3 (zona oeste) e Vieira Ferreira Neto
(Niterói, a 15 km do Rio). A secretaria não divulgou a proporção de
presos de cada facção nas prisões.
As prisões Bangu 1 (zona oeste),
Ary Franco (zona norte), Hélio
Gomes (centro), Talavera Bruce
(para mulheres, na zona oeste) e
de Campos (a 280 km do Rio) e a
Colônia Agrícola (Magé, a 60 km
do Rio) têm presos do CV, do TC
e da ADA (Amigo dos Amigos).
Ao dar entrada no sistema carcerário, o preso diz sua facção. Se
não tem uma, fica com os da facção atuante na área em que mora.
Essa situação é criticada pelo
juiz da Vara de Execuções Penais,
Carlos Augusto Borges. Ele disse,
por meio da assessoria do Tribunal de Justiça, que é preciso "combater as facções na origem".
"Hoje, quando um preso chega
ao sistema penitenciário, perguntam de que facção ele é. Aí, mesmo que não seja de facção alguma, já fica sendo", afirmou.
Para o defensor público Alexandre Paranhos, que em 11 de abril
deste ano vistoriou Benfica, um
dos problemas do sistema carcerário é justamente essa mistura.
"Em Benfica, o pessoal do TC dizia ter medo porque o CV tinha
muito mais presos."
A medida também é criticada
pelo presidente do sindicato dos
agentes penitenciários, Paulo Ferreira, que a qualificou como "loucura". Nas contas do sindicato, o
ideal seria o sistema carcerário
fluminense ter no mínimo 5.000
agentes -tem 1.400, um para cada 140 dos cerca de 20 mil presos.
"Massacre anunciado"
O presidente da ONG (organização não-governamental) Conselho da Comunidade, Marcelo
Freixo, que também vistoriou a
prisão, previu uma tragédia em
Bangu 3: "Misturar facções não
enfraquece nenhuma delas. Pelo
contrário, aumenta as rivalidades.
É uma disputa sanguinária por espaço. Aconteceu em Benfica um
massacre anunciado. Alertamos
para Bangu 3, onde estão os principais líderes das facções. Nova
matança pode acontecer".
O temor é consenso entre agentes penitenciários e representantes de entidades que acompanham a situação carcerária do
Rio. Em Bangu 3 há cerca de mil
presidiários. Metade é vinculada
ao CV. A outra metade, ao TC. A
separá-los, duas paredes de alvenaria com uma chapa de aço ao
meio de cada uma.
Bangu 3 sempre foi ocupada pelo CV. Em abril, o governo estadual transferiu para lá cerca de
500 presos do TC, revoltando os
rivais. Na rebelião da Casa de Custódia de Benfica, uma das reivindicações apresentadas pelos presos era a de que Bangu 3 voltasse a
ser ocupada só pela facção.
Na tentativa de dificultar o armamento dos presos das duas
facções, a Secretaria de Administração Penitenciária instituiu um
sistema de rodízio. Quando houver a suspeita de que há armas nas
celas, a secretaria pretende trocar
os presos de galeria sem aviso prévio. Assim, as armas ficariam à
disposição dos inimigos.
Anteontem à tarde, dois revólveres e uma granada foram encontrados na penitenciária.
Já um PM foi preso ontem de
manhã tentando entrar em Bangu
com uma arma de brinquedo e
uma bomba de fabricação caseira.
O secretário Pereira dos Santos
não foi localizado pela Folha para
comentar as críticas à política do
governo. Sua assessoria informou
que há presídios, como o Hélio
Gomes, em que o convívio entre
grupos adversários é harmonioso.
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