São Paulo, quarta-feira, 04 de agosto de 2004

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PRESÍDIO SEM LEI

Sindicato diz que unidade havia sido avisada sobre ameaças entre membros da mesma facção; direção nega

No Rio, presos matam 8 a pauladas em cela

MARIO HUGO MONKEN
DA SUCURSAL DO RIO

Oito detentos do presídio Ary Franco, em Água Santa (zona norte do Rio), foram mortos ontem de manhã a estocadas e pauladas em um suposto "acerto de contas" entre presos da unidade.
A chacina foi comandada por 38 presos vinculados à facção criminosa TC (Terceiro Comando). Os mortos seriam da mesma facção.
O grupo, da cela 20, fez dois agentes penitenciários reféns por volta das 7h30, na conferência dos presos, tomou as chaves, invadiu outras celas da mesma galeria, a A, e matou os oito detentos.
Ao perceberem a ação, agentes da Secretaria Estadual de Administração Penitenciária entraram no presídio. A Polícia Militar cercou a área externa. Após a matança, os presos voltaram para as celas e liberaram os reféns às 9h30. Apesar dos reféns, a secretaria afirmou que não houve rebelião, e sim um confronto entre presos.
Segundo o presidente do sindicato dos agentes penitenciários, Paulo Ferreira, a direção da unidade sabia de uma possível matança. No último dia 13, segundo ele, o grupo que liderou as mortes (e que havia sido transferido após motim no presídio Hélio Gomes) procurou o diretor do Ary Franco, major Alexandre Azevedo de Jesus, para se queixar de ameaças dos oito presos mortos ontem.
O diretor do presídio afirmou desconhecer ameaças e disse não saber o motivo da matança. O subsecretário de Administração Penitenciária, Aldney Peixoto, declarou que vai apurar a denúncia e que, se houve falha, o diretor poderá ser punido. Para o secretário Astério Pereira dos Santos, a divergência entre presos é normal. "Como acontece no mundo livre, também no interior da cárcere há divergências."
O governo do Rio pretende desativar o Ary Franco até o final do ano. Com capacidade para 958 detentos, o presídio conta hoje com 1.212 presos.

Agentes
Os agentes reféns foram identificados como Renato Luiz Rodrigues Pinto da Rocha e Tarciso Pinheiro Campos. Segundo o diretor, ambos foram levados para uma cela isolada da galeria e não viram a matança.
O diretor do Ary Franco disse que será aberta sindicância para apurar se houve facilitação na entrada de estoques (armas artesanais) de metal nas celas.
Para o sindicalista, a falta de agentes foi uma das razões que levaram à chacina. Ele disse que o lugar conta com oito -o ideal seriam 20. "Inferiorizados numericamente, não estamos conseguindo dar conta do recado." Membro da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio, o deputado Alessandro Molon (PT) foi ao presídio e disse que havia só cinco agentes no plantão -três faltaram.

45 mortos em 2 meses
A chacina ocorrida ontem no presídio Ary Franco ocorreu em circunstâncias semelhantes ao massacre que aconteceu na Casa de Custódia de Benfica (zona norte) entre os dias 29 e 31 de maio, quando 30 presos e um agente foram mortos. Os dois fatos expuseram a frágil segurança.
Em Benfica, os presos vinculados à facção criminosa Comando Vermelho tentaram uma fuga em massa. Como não conseguiram, fizeram 24 pessoas reféns e invadiram as galerias destinadas a detentos do Terceiro Comando.
Em pouco mais de dois meses, 45 pessoas, entre agentes e presos, morreram em oito rebeliões, tentativas de fugas ou acertos de contas em presídios fluminenses.
O subsecretário Aldney Peixoto reconhece as deficiências na segurança das unidades. "Durante um tempo, ficamos muito preocupados com o complexo prisional de Bangu e esquecemos das outras unidades", disse.


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