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DANUZA LEÃO
Num aeroporto
A sala de espera de um aeroporto é um universo fascinante. É fácil saber quem está
louco para ir, quem está louco para ficar, e quando cai uma tempestade daquelas, com direito a
raios e trovões, e o vôo é cancelado, mesmo quem não costuma ter
medo de avião fica apreensivo,
para dizer o mínimo.
A primeira coisa é pegar o celular; passa a ser uma necessidade
vital falar com alguém, não (só)
para dizer que vai se atrasar mas
para ouvir uma voz humana,
mais humana do que a da funcionária da companhia aérea que
anunciou que o aeroporto está
sem teto.
Os passageiros se comportam
bem, como se voar fosse uma coisa muito natural -o que, aliás,
não é. Pegam a agenda, rabiscam
qualquer coisa e continuam telefonando sem parar. O alto-falante avisa que não há previsão para
o vôo, e todos continuam fingindo
que são pessoas civilizadas e se
portando como tal; no fundo,
morrendo de medo.
Só que ninguém tem uma reação nem toma uma atitude. Ficam todos quietos, parados, esperando por uma ordem superior
que vai estabelecer, a partir da
meteorologia, quando o avião vai
poder decolar. Todos com medo,
mas esperando pelas decisões que
vão decidir o seu destino -ficar
ou ir (e aquela que a gente não
ousa pensar, para não atrair o
pior).
Nunca vi ninguém desistir, pegar a sacola e ir embora para tentar embarcar no dia seguinte,
quando o tempo provavelmente
estará melhor -tempestades não
costumam durar muitas horas; e,
do fundo do coração, pensar: dane-se a reunião, dane-se o jantar
marcado, dane-se o mundo.
Entrar num avião debaixo de
tempestade não é fácil, mas as
pessoas permanecem paralisadas;
pelas convenções, pelos compromissos, pelo dever.
Apesar de existirem outras convenções, outros compromissos,
outros deveres mais importantes
do que tudo, ninguém se lembra
de que é dono da própria vida e
que certas coisas -como o medo,
por exemplo- podem e devem
ser respeitadas.
Numa hora dessas todo mundo
tem um pressentimento -na
maioria das vezes falso- de que
não deve ir. Se resolver voltar para casa, vai ver que não há nada
melhor, numa noite de temporal,
do que estar na cama. Se estiver
numa cidade estranha, sempre
poderá ir ao bar do hotel tomar
uma bebida e conversar com o
garçom, mas não: é como se todos
tivessem o seu destino traçado e
não pudessem nem tentar mudá-lo -e é claro que sempre se pode.
É uma mão-de-obra: cancelar o
que estava marcado, talvez perder a chance de fechar aquele negócio -afinal, vai dizer o quê? A
verdade, que teve medo do mau
tempo? Não fica nem bem, no
mundo dos adultos -e dos
negócios.
Mas, da próxima vez que isso
acontecer, tente. Tente respeitar
seus instintos mais básicos, tenha
a coragem de ter medo, aja como
uma criança -só as crianças e os
muito idosos têm o direito de serem irresponsáveis- e jogue tudo para o alto; isso é tão bom, às
vezes.
Pode ser que perca algumas coisas, pode ser que não, mas você terá a leve impressão de que é capaz
de comandar sua própria vida.
Não é verdade, claro, mas é bem
agradável uma ilusão assim, de
vez em quando. Só agradável
não: é fundamental.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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