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VIOLÊNCIA
Segundo militares, Faria furou bloqueio; irmã da namorada diz que vítima temia ser alvo de armação de criminosos
Exército mata professor em blitz no Rio
SABRINA PETRY
DA SUCURSAL DO RIO
HENRI CARRIÈRES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
O professor de inglês Frederico
Branco de Faria, 56, foi morto ontem no Rio de Janeiro ao passar
por uma barreira do Exército. Ele
é a primeira pessoa morta pelos
militares desde sexta-feira, quando começou a Operação Guanabara, montada para tentar conter
a onda de violência da semana
passada causada por traficantes.
Faria foi atingido por um tiro
disparado por um militar por volta da 0h de ontem, em Tomás
Coelho (zona norte do Rio). Ele
dirigia seu carro, um Corsa azul,
pela avenida Automóvel Club. O
atestado de óbito registra que a
bala perfurou o tórax e o abdome,
causando lesões no coração, no
baço, no rim esquerdo, nas alças
intestinais e no fígado.
As versões são conflitantes, mas
há uma unanimidade: um militar
do Exército fez o disparo.
Para o Comando Militar do Leste, Faria teria furado um bloqueio
da Polícia Militar e de um grupo
de nove pára-quedistas do Exército e, por isso, foi alvejado.
Segundo registro feito na 44ª DP
(Inhaúma), o professor foi vítima
de bala perdida -teria passado
numa troca de tiros entre militares do Exército e PMs contra traficantes do morro do Juramento.
É a versão também da Secretaria
de Segurança Pública do Rio.
"Numa operação de envergadura
tão grande, é possível que fatos
como esses ocorram", disse o secretário Josias Quintal. "Esse caso
não vai fazer com que esse aparato não seja usado novamente."
Faria estava com a namorada,
Rosângela Silva, 38, que nada sofreu. A irmã de Rosângela, Cleide,
disse à Folha que os dois voltavam de um baile e iam para a casa
dela, em Cascadura (zona norte).
A versão de Cleide se aproxima
mais à do Comando Militar do
Leste. "Eles não pararam na blitz.
Eles se assustaram, pensando que
podiam ser bandidos, que podia
ser uma falsa blitz", disse a irmã
de Rosângela por telefone. A Folha foi até a casa de Rosângela,
mas a família disse que ela não falaria por estar muito chocada.
À noite, no Instituto Médico Legal, um irmão do morto, Luís
Branco, disse não acreditar na
versão de que o irmão não parou.
"Estou abismado com esse tipo de
coisa. Ele jamais faria isso. Mas,
mesmo que não tivesse parado,
não justifica isso aí [os tiros"."
Luís disse não conhecer Rosângela, que há três meses namoraria
o irmão. Os irmãos moravam juntos havia 38 anos, em Vista Alegre
(zona norte). Frederico era solteiro, sem filhos e professor de inglês
do Estado, segundo o irmão.
Ele disse que Frederico teria sido atingido também, de raspão,
na cabeça, por um tiro de fuzil.
Não houve confirmação oficial. O
tiro fatal não teria sido dado pelas
costas, como dizem outras versões, mas numa posição mais lateral à vítima, conforme o irmão.
Nota do Comando Militar do
Leste diz que, após Faria desobedecer à ordem para parar, dada
por PMs, um tenente do Exército
se colocou à frente do carro, "mas
o motorista, prosseguindo no intuito de evadir-se, tentou atropelá-lo". Militares teriam dado tiros
de advertência para o alto, que teriam sido desobedecidos. "Em
consequência, dentro das normas
previstas, foram efetuados [pelos
militares" disparos contra o veículo infrator", diz a nota.
O Corsa foi atingido por três tiros, um no capô e dois na lataria,
do lado do motorista. O delegado
Avelino da Costa Lima Filho, que
registrou o caso a partir do relato
de um PM, afirmou que ele não tinha antecedentes criminais.
Uma ambulância do Exército
levou Faria e a namorada para o
hospital Salgado Filho, no Méier
(zona norte), onde ele morreu.
Um oficial identificado só como
tenente Gomes, da 26ª Brigada de
Infantaria Pára-quedista, foi o
responsável pelo socorro.
Segundo o livro de ocorrências
do hospital, Rosângela disse que
"houve um grande tiroteio" ao
passarem. Militares do Exército
estavam na porta da DP e do Salgado Filho ontem. Faria será enterrado hoje, às 10h, no cemitério
de Irajá, na zona norte do Rio. Ele
era solteiro e não tinha filhos.
A Operação Guanabara começou na última sexta, com 39 mil
homens, entre Forças Armadas,
Polícia Federal, Polícia Civil, Polícia Militar e Guarda Municipal.
Na semana passada, atentados de
traficantes deixaram três mortos e
48 veículos incendiados.
Colaboraram Fernando Magalhães e
Fabiana Cimieri, da Sucursal do Rio
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