São Paulo, sexta-feira, 05 de março de 2004

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SAÚDE

Para representantes do governo, entidade internacional cita dados sem comprovação ao recomendar consumo menor de açúcar

Brasil não apóia ação antiobesidade da OMS

AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL

A guerra contra a obesidade gerou uma crise entre os ministérios da Saúde e da Agricultura. Apesar de todas as sinalizações de que o país apoiaria a estratégia global de alimentação saudável elaborada pela OMS (Organização Mundial da Saúde), o governo se manifestou contra o documento.
"Estamos revoltados", afirma Valéria Guimarães, presidente da Sbem (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia). Ela integrou um grupo de cientistas brasileiros que enviaram ao Ministério da Saúde uma carta de aprovação às propostas.
Ontem, um manifesto de repúdio à posição brasileira foi divulgado pela Sbem, com o apoio de entidades como a AMB (Associação Médica Brasileira) e a Abeso (Associação Brasileira de Estudos da Obesidade).
No documento, a OMS afirma que a má alimentação é responsável por grande parte das doenças crônicas não-transmissíveis, como problemas cardiovasculares, câncer e diabetes do tipo 2.
Para combater esses males, a instituição recomenda que sejam taxados os alimentos que não são considerados saudáveis e que seja adotada uma dieta que tenha, no máximo, 10% de energia proveniente de açúcar. No Brasil, esse índice é de 19%.

Pressão
O documento deveria ter sido finalizado em janeiro. O prazo para manifestações, no entanto, foi estendido até 29 de fevereiro por causa das pressões da indústria do açúcar nos Estados Unidos, que não quer que o documento seja submetido à votação na Assembléia Mundial de Saúde, em maio.
Das 52 manifestações encaminhadas à OMS, 40 foram favoráveis e três tiveram uma posição parcialmente favorável. Cinco mensagens tiveram posição contrária: além de Brasil, EUA, Ilhas Maurício e Suazilândia, uma segunda resposta do Brasil, como líder do G-77, grupo que reúne países em desenvolvimento.
Na resposta enviada pela missão permanente do Brasil em Genebra, no último dia 29, é dito que os dados do órgão ainda carecem de comprovação científica.
"Isso é um absurdo. Foi a vitória da economia sobre a saúde", afirma o médico Carlos Monteiro, que atua como consultor da OMS. Na opinião dele, a decisão decorre da pressão das empresas de açúcar sobre o Ministério da Agricultura, que entrou em atrito com a pasta da Saúde.
O Brasil é o maior produtor mundial de açúcar, e as exportações do produto geram para o país US$ 2,3 bilhões por ano. "Eu simplesmente transmiti ao ministro o que nós achamos sobre o assunto. Não existe uma prova científica de que o açúcar faça mal à saúde", afirma Eduardo Carvalho, presidente da União da Agroindústria Canavieira do Estado de São Paulo (Unica).
Em nota divulgada ontem, o Ministério da Saúde informou que a resposta apresentada pela missão permanente do Brasil em Genebra não reflete a posição definitiva do governo federal sobre a questão. De acordo com a própria nota oficial, a posição é baseada, fundamentalmente, em aspectos econômicos que foram debatidos em uma reunião do G-77, no âmbito da FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação).


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