São Paulo, domingo, 05 de junho de 2005

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"É melhor errar com cotas do que sem elas"

DA REPORTAGEM LOCAL

O MEC apresentou na última segunda-feira a nova versão do projeto de reforma universitária. Entidades como a ONG Educafro e o MSU (Movimento dos Sem Universidade) se disseram enganadas com a proposta que dá prazo até 2015 para que as universidades federais tenham 50% de alunos do ensino médio público em suas salas de aula. Na versão original, as cotas teriam implementação imediata.
"É preferível errar com a política de cotas do que errar sem a política de cotas", afirmou o ministro da Educação, Tarso Genro, 58. Ele conversou anteontem com a Folha, em São Paulo. (FT)

Folha - Qual é a maior mudança do primeiro para o segundo projeto de reforma?
Tarso Genro -
O segundo é mais rigoroso. É um documento que mantém os eixos centrais da primeira versão. Primeiro: tratar o ensino superior como um sistema. Segundo: qualificar e expandir o ensino público para 40% [das vagas] até 2011 [hoje de 30%].

Folha - Mas, se as instituições privadas continuarem crescendo, os 40% representarão um número absoluto cada vez maior.
Tarso -
O ensino privado ultrapassou o limite da sua potência. Ele tem uma relação de mercado com a educação. Agora, precisamos expandir o número de vagas gratuitas. Com a instituição do Fundeb [fundo que deverá financiar todo o ensino básico], vamos ter um crescimento vertiginoso do ensino médio e uma necessidade maior de oferta de vagas.

Folha - O segundo documento está mais flexível com as instituições privadas [na segunda versão, foi retirado um conselho que poderia interferir na administração]?
Tarso -
Naquele primeiro dispositivo, havia dúvidas da constitucionalidade de regular a estrutura da mantenedora. Não é necessário, para que sejamos rigorosos [com a qualidade], esse controle.

Folha - O ex-ministro Paulo Renato Souza entende que, com a formação dos colegiados superiores, a mantenedora pode perder o controle sobre a instituição, mesmo sendo particular [os donos poderão indicar até 20% dos representantes do órgão, responsável pela organização da universidade].
Tarso -
Se quisermos dar conteúdo à autonomia [às universidades], temos de fazer com que ela repouse em alguma força hegemônica. Na nossa opinião, tem de ser o corpo docente, com uma relação dialogada, com a devida proporcionalidade com estudantes e servidores.

Folha - Mas apenas 20% de participação do mantenedor não parece que o dono irá perder o poder sobre a sua instituição?
Tarso -
Não interfere porque a relação entre a mantenedora e a mantida pode ser balizada por normas relacionadas a normas educacionais, mas não extingue o direito à propriedade.

Folha - Sobre as cotas, os movimentos sociais entendem que houve um recuo do MEC em relação à primeira versão da reforma.
Tarso -
Eles receberam de uma forma muito correta. Eles têm de levar ao limite o seu posicionamento. Mas há outras forças democráticas que acham que a política de cotas não é a questão mais adequada para resolver a questão da inclusão de pobres e que há outras formas. Eu não compartilho com essa opinião. Mas o que eu tenho de fazer como ministério? Embora eu tenha a visão de que a política de cotas é uma política absolutamente correta, que é preferível errar com a política de cotas do que errar sem a política de cotas, como ocorreu nos últimos 500 anos, na produção da norma nós temos que levá-la a sua melhor possibilidade, mas mantendo a unidade de uma ampla frente política que vai dar viabilidade para a reforma. Se não conseguirmos uma política de cotas plena, que tenhamos uma política que seja um bom passo na inclusão social. Vamos ver na votação desse projeto qual vai ser a posição do Congresso. Se for aprovada, a questão está encerrada. O prazo de quatro anos é bom, que permite a transição.

Folha - Então as cotas não precisariam estar na terceira versão da reforma?
Tarso -
Não precisariam. Ou apenas algo como ""fica mantido o que está na lei número tal".

Folha - Mas aí as universidades federais vão voltar a reclamar, pedindo mais flexibilidade na norma.
Tarso -
Vão. Aí, se elas quiserem levar a termo a proposta que elas têm, vão ter de configurar uma hegemonia na grande frente que defende a reforma para tentar revogar aquilo que foi aprovado.




















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