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"É melhor errar com cotas do que sem elas"
DA REPORTAGEM LOCAL
O MEC apresentou na última
segunda-feira a nova versão do
projeto de reforma universitária.
Entidades como a ONG Educafro
e o MSU (Movimento dos Sem
Universidade) se disseram enganadas com a proposta que dá prazo até 2015 para que as universidades federais tenham 50% de
alunos do ensino médio público
em suas salas de aula. Na versão
original, as cotas teriam implementação imediata.
"É preferível errar com a política de cotas do que errar sem a política de cotas", afirmou o ministro da Educação, Tarso Genro, 58.
Ele conversou anteontem com a
Folha, em São Paulo.
(FT)
Folha - Qual é a maior mudança
do primeiro para o segundo projeto de reforma?
Tarso Genro - O segundo é mais
rigoroso. É um documento que
mantém os eixos centrais da primeira versão. Primeiro: tratar o
ensino superior como um sistema. Segundo: qualificar e expandir o ensino público para 40%
[das vagas] até 2011 [hoje de
30%].
Folha - Mas, se as instituições privadas continuarem crescendo, os
40% representarão um número absoluto cada vez maior.
Tarso - O ensino privado ultrapassou o limite da sua potência.
Ele tem uma relação de mercado
com a educação. Agora, precisamos expandir o número de vagas
gratuitas. Com a instituição do
Fundeb [fundo que deverá financiar todo o ensino básico], vamos
ter um crescimento vertiginoso
do ensino médio e uma necessidade maior de oferta de vagas.
Folha - O segundo documento está mais flexível com as instituições
privadas [na segunda versão, foi
retirado um conselho que poderia
interferir na administração]?
Tarso - Naquele primeiro dispositivo, havia dúvidas da constitucionalidade de regular a estrutura
da mantenedora. Não é necessário, para que sejamos rigorosos
[com a qualidade], esse controle.
Folha - O ex-ministro Paulo Renato Souza entende que, com a formação dos colegiados superiores, a
mantenedora pode perder o controle sobre a instituição, mesmo
sendo particular [os donos poderão
indicar até 20% dos representantes
do órgão, responsável pela organização da universidade].
Tarso - Se quisermos dar conteúdo à autonomia [às universidades], temos de fazer com que ela
repouse em alguma força hegemônica. Na nossa opinião, tem de
ser o corpo docente, com uma relação dialogada, com a devida
proporcionalidade com estudantes e servidores.
Folha - Mas apenas 20% de participação do mantenedor não parece
que o dono irá perder o poder sobre a sua instituição?
Tarso - Não interfere porque a
relação entre a mantenedora e a
mantida pode ser balizada por
normas relacionadas a normas
educacionais, mas não extingue o
direito à propriedade.
Folha - Sobre as cotas, os movimentos sociais entendem que houve um recuo do MEC em relação à
primeira versão da reforma.
Tarso - Eles receberam de uma
forma muito correta. Eles têm de
levar ao limite o seu posicionamento. Mas há outras forças democráticas que acham que a política de cotas não é a questão mais
adequada para resolver a questão
da inclusão de pobres e que há outras formas. Eu não compartilho
com essa opinião. Mas o que eu
tenho de fazer como ministério?
Embora eu tenha a visão de que a
política de cotas é uma política
absolutamente correta, que é preferível errar com a política de cotas do que errar sem a política de
cotas, como ocorreu nos últimos
500 anos, na produção da norma
nós temos que levá-la a sua melhor possibilidade, mas mantendo a unidade de uma ampla frente
política que vai dar viabilidade
para a reforma. Se não conseguirmos uma política de cotas plena,
que tenhamos uma política que
seja um bom passo na inclusão
social. Vamos ver na votação desse projeto qual vai ser a posição
do Congresso. Se for aprovada, a
questão está encerrada. O prazo
de quatro anos é bom, que permite a transição.
Folha - Então as cotas não precisariam estar na terceira versão da
reforma?
Tarso - Não precisariam. Ou
apenas algo como ""fica mantido o
que está na lei número tal".
Folha - Mas aí as universidades
federais vão voltar a reclamar, pedindo mais flexibilidade na norma.
Tarso - Vão. Aí, se elas quiserem
levar a termo a proposta que elas
têm, vão ter de configurar uma
hegemonia na grande frente que
defende a reforma para tentar revogar aquilo que foi aprovado.
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