São Paulo, sábado, 5 de julho de 1997.



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MEMÓRIA
Cama que pertenceu ao escritor está desmontada no vestiário dos faxineiros da biblioteca da Uni-Rio; peças não estão identificadas
Móveis de Machado de Assis não têm onde ficar

Rosane Marinho/Folha Imagem
Vera Dadebei, diretora da biblioteca da Uni-Rio, mostra cama de Machado de Assis


DIOGO DE HOLLANDA CAVALCANTI
free-lance para a Folha

A 15 dias do centenário da Academia Brasileira de Letras, uma parte da memória do escritor Machado de Assis, fundador da casa, é mantida em más condições de conservação na biblioteca do Centro de Letras e Artes da Uni-Rio (Universidade do Rio de Janeiro).
O acervo da biblioteca inclui móveis e documentos do escritor. A pior situação é a da cama que pertenceu a Machado de Assis e sua mulher, Carolina. Desmontada, ela está guardada no vestiário dos faxineiros da biblioteca.
"Não tenho como manter uma cama armada dentro de uma biblioteca. Sei que não é a melhor solução, mas não tenho onde colocá-la", diz Vera Lúcia Dobedei, diretora da biblioteca.
No salão do segundo andar da biblioteca (que fica na Urca, zona sul do Rio) estão três aparadores, com tampo de mármore e espelhos de cristal e dois armários baixos.
Na sala de obras raras da biblioteca estão uma mesa de refeições, com dez cadeiras, e um tabuleiro de xadrez de madeira e vidro, em estilo imperial.
Essas peças estão em melhor estado do que a cama, mas não estão identificadas -ou seja, os frequentadores da biblioteca não são informados de que as peças pertenceram a Machado de Assis (1839-1908), um dos mais importantes escritores brasileiros, autor de "Dom Casmurro" e "Memórias Póstumas de Brás Cubas", entre outros.
A diretora diz que a não-identificação dos objetos que pertenceram ao escritor é proposital. Segundo ela, haveria risco de depredação ou roubo caso fossem identificados. Além disso, as peças não estão seguradas.

Rosane Marinho/Folha Imagem
Mesa que ficava na sala de jantar de Machado de Assis


"É melhor que as pessoas não saibam, para não chamar a atenção", diz a diretora.
O acervo da biblioteca inclui 23 móveis (além dos aparadores, da cama e da mesa, uma mesa de cabeceira e várias cadeiras), quatro quadros (entre eles, "A Dama do Livro", de Roberto Fontana), dois jornais e seis fotografias (todas de Machado e de Carolina.
Há ainda cinco poemas (três compostos e manuscritos pelo próprio escritor), 15 contratos (a maioria com os donos da editora Garnier), cinco documentos pessoais (entre eles a cópia de seu testamento), 16 correspondências recebidas e 15 enviadas. Toda a documentação está guardada na sala de obras raras da biblioteca.
A diretora conta que o acervo foi adquirido em um leilão promovido pela família de Machado pelo atual presidente da Fundação Biblioteca Nacional, Eduardo Portella, em 1979.
"O desejo de Portella era doar os móveis à ABL. Mas a legislação brasileira proíbe que um bem público seja doado a uma instituição privada, como é o caso da Academia. Por isso, o ex-ministro doou o acervo à UFRJ, que, por sua vez, cedeu esses móveis e documentos à Uni-Rio", diz.
Na época, o reitor da universidade era o escritor Guilherme Figueiredo. Durante sua gestão, Figueiredo conservou os objetos e documentos no prédio da reitoria.
Em 1989, quando Guilherme Figueiredo deixou o cargo, os móveis foram levados para a biblioteca. Agora, de acordo com Vera Dobedei, o reitor Hans Dohmann estuda a possibilidade de criar o Museu da Uni-Rio, para onde o acervo seria transferido.


Colaborou Cristina Grillo, da Sucursal do Rio


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