São Paulo, quarta, 5 de agosto de 1998

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Prática é condenável, mas válida, dizem advogados

da Reportagem Local

O costume do governo de usar medidas provisórias para modificar ou suspender os efeitos de leis é politicamente condenável, mas válido, segundo advogados ouvidos ontem pela Folha.
A diferença é que o projeto de lei, para entrar em vigor, tem de ser aprovado no Congresso, depois de passar por discussões que, a rigor, deveriam avaliar sua constitucionalidade, finalidade e aplicabilidade, entre outros aspectos.
Já a medida provisória é editada pelo governo federal, geralmente sem discussão com a sociedade.
"A função de legislar, ou seja, formular leis, é do Congresso, e não do governo, o Poder Executivo. A medida provisória só deveria ser usada como é prevista na Constituição, ou seja, nos casos de relevância e urgência", diz José Roberto Batochio, ex-presidente da OAB e especializado em direito constitucional.
Batochio admite, porém, que dificilmente a edição da medida pode ser questionada na Justiça. "No final das contas, esse mau costume acaba valendo", diz.
Na Constituição, a medida provisória está prevista no artigo 62, que diz: "Em caso de relevância e urgência, o presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei (...)".
O texto prevê que as medidas "perdem a eficácia se não forem convertidas em lei no prazo de cinco dias". Mas, por força de uma lacuna na Constituição, o que acontece desde a gestão de José Sarney (1985-1990), é que o governo reedita as medidas provisórias por prazos indefinidos.
"O recurso da medida provisória só pode ser usado em casos de absoluta excepcionalidade, e esse é um desses, na minha opinião", diz o advogado Luiz Antonio Sampaio Gouveia, que vê inconstitucionalidade na doação presumida de órgãos.
"Meu corpo pertence a mim e não ao Estado. E, depois de mim, pertence aos meus parentes", diz.
Segundo o advogado Celso Bastos, professor de pós-graduação em direito na PUC-SP, a lei dos transplantes ficará suspensa até que a medida provisória seja votada pelo Congresso Nacional. Quando aprovada em plenário, ela se converte também em lei.
As únicas limitações a esse poder, segundo Bastos, dizem respeito à legislação penal. "Seria um absurdo o governo poder prender alguém por meio da edição de uma medida provisória", diz Bastos. (RV)



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