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LETRAS JURÍDICAS
Meios pacíficos de solução dos conflitos
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
R etomo o tema da posição
dos Estados Unidos em face
do Iraque na ótica do Direito. O
assunto sugere uma volta no tempo, pois, no século 20, a guerra era
uma opção aceita quando duas
ou mais nações tivessem litígios a
resolver. Hoje, conforme lembra o
juiz da Corte Internacional de
Haia, o brasileiro José Francisco
Rezek, em seu livro "Direito Internacional Público" (Saraiva, 1991,
407 páginas): "A guerra é um ilícito internacional".
-E daí? -perguntará o leitor.
Que diferença faz ser ilegal, segundo os ditames do Direito internacional? Alguém vai impor a
legalidade?
A resposta é óbvia: não faz a
menor diferença, porque o Direito
internacional público está mais
para as fábulas de La Fontaine,
como a célebre história do lobo e
do cordeiro, do que para o Direito. Este, em sendo afrontado, oferece medidas contra o infrator. Se
o infrator for a nação mais poderosa do universo, a força de suas
armas e de sua economia preponderará. Vale a pena, mesmo assim, lembrar alguns preceitos historicamente válidos sobre a solução pacífica dos litígios.
A lição de Rezek quanto aos
meios para evitar a detonação do
conflito armado indica, como o
primeiro deles, aquele que tem
frequentado o noticiário dos jornais. Trata-se do inquérito, para
"apurar a materialidade dos fatos", para impedir os combates, as
mortes e a destruição. No caso do
Iraque, se o conflito não for evitado, a aviação americana destruirá tudo o que seus comandantes
julgarem conveniente destruir,
sem aparente possibilidade eficaz
de reação pelos iraquianos. Os
inspetores da ONU, na solução
pacífica, seriam encarregados de
verificar se o Iraque tem ou não
tem armas de destruição em massa, revelando ao mundo a verdade encontrada. George W. Bush
não aceitou tal solução e mandou
o recado do Velho Oeste a Saddam Hussein: é rendição total ou
vai levar bala.
O que se viu nas últimas semanas foi o recurso ao esforço diplomático, sempre por terceiros, ante
a inviabilidade do entendimento
direto entre as partes. O Brasil já
atuou nesse campo, por exemplo,
na chamada Guerra do Chaco,
entre a Bolívia e o Paraguai nos
anos 30 do século passado. Foi a
mediação como segunda forma
de impedir ou resolver o conflito.
Consiste, na lição de Rezek, em
tomar "conhecimento do desacordo e das razões de cada um dos
contendores para finalmente propor-lhes uma solução". A Arábia
Saudita e outros países fizeram
sugestões recentes, buscando evitar o ataque unilateral, sem satisfazer o primeiro elemento da mediação, ou seja, a confiança das
partes em disputa. Outra curiosidade histórica é a de que o Brasil,
a Argentina e o Chile fizeram mediação entre os Estados Unidos e
o México, em 1914, permitindo-lhes resolver questões de
fronteira.
A ONU é o teatro apropriado
para a aplicação dos meios políticos de solução, conforme consta
da Carta das Nações Unidas, sobretudo através do Conselho de
Segurança. Em certos casos, a
ONU pode intervir militarmente,
mas a prática demonstra que essa
intervenção não é capaz de recompor a paz como solução definitiva. Rezek, escrevendo doutrinariamente (sem ter em vista o
caso atual), observa que a desobediência a uma resolução do Conselho de Segurança constitui ato
ilícito, "como seria a desobediência a uma sentença arbitral ou judiciária". Mas o fato é que Bush
filho, querendo "lavar a honra"
de Bush pai, parece não ligar a
mínima para a conversa dos juristas. As consequências, porém,
nos atingirão a todos. Juristas e
não-juristas. Só podem ser más.
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