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DANUZA LEÃO
Carta a d. Marisa
Seria bacana termos uma primeira-dama engajada
em algum projeto social, fosse ele qual fosse
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D. MARISA, a senhora deve estar muito feliz; seu marido
ganhou as eleições, e será
presidente por mais quatro anos.
Parabéns.
Imagino que quando ele foi eleito
pela primeira vez, deve ter sido difícil para a senhora; seria para qualquer mulher. Se habituar a uma nova vida, ter que fazer coisas em que
nunca pensou; por outro lado, não
poder mais fazer um monte de coisas às quais estava habituada, ter
que obedecer ao protocolo, andar
cercada por seguranças, não poder
entrar num shopping -a senhora
deve ser louca por um shopping,
não?- e tendo que ter uma vida privada quase secreta, já que a imprensa está sempre de olho.
De olho para falar da cor do esmalte de suas
unhas, do penteado, do botox que
botou -ou não-, e correndo sempre o risco de alguém de sua intimidade ser indiscreta e contar o que a
senhora come no café da manhã, se
faz dieta, se fuma, enfim, todas essas
coisas que qualquer mulher tem liberdade para fazer, menos a primeira-dama.
Devem ter sido quatro
anos difíceis, mas já passaram.
Agora a senhora tem mais quatro
pela frente; quais são seus planos?
Não seria hora de fazer alguma coisa
além de ficar sentada naquela cadeirinha, nas cerimônias oficiais, enquanto seu marido discursa? Ah, d. Marisa, esse país é cheio de problemas, e a senhora poderia ajudar em alguma coisa. Já existe o Bolsa Família e o Fome Zero, mas ainda há muita coisa a ser feita.
Não digo que a senhora seja a mulher mais poderosa do país, mas é casada com o homem mais poderoso, por isso pode
decidir fazer o que quiser, e terá toda
a ajuda de que precisar. Ajuda financeira, e ajuda de centenas de mulheres que adorariam colaborar com
qualquer coisa que a senhora inventasse fazer.
Capacidade a senhora
tem: não me esqueço de um programa de televisão onde a vi fazendo
sanduíches para vender nas assembléias de metalúrgicos, anos antes
de sonhar onde iria chegar.
Esse tipo de coisa a senhora não precisa mais
fazer, mas existem outras que não
seriam nenhum sacrifício, e que poderiam fazê-la até muito feliz por estar ajudando o governo de seu marido. Porque botar uma camiseta, sorrir e aplaudir, convenhamos, é muito pouco.
Fazer o quê? Não falta quem lhe
diga. Seu marido tem um monte de
assessores, todos prontos para ter
50 idéias geniais para que a senhora
faça alguma coisa que melhore a vida de quem precisa. A senhora é forte, decidida, e não tem sentido passar mais quatro anos trocando de
terninho para acompanhar o presidente nas viagens, sorrindo para os
fotógrafos, não dizer nada sobre assunto algum, e não fazer rigorosamente nada.
Não que a senhora tenha obrigação, mas seria bacana termos uma primeira-dama engajada em algum projeto social, fosse ele
qual fosse.
Mas se a senhora quiser continuar
a viver a vidinha que vive há quatro
anos, poderia pelo menos - pela
imagem, d. Marisa, pela imagem -
visitar às vezes um hospital público
(sem avisar, para ver a fila na porta),
uma creche, uma escola, para mostrar que se interessa pelos mais necessitados, e que seus próximos quatro anos não serão mais apenas
umas férias passadas entre o Alvorada e a Granja do Torto, além de viajar pelo mundo no seu luxuoso jatinho. Pense nisso, d. Marisa. Pegaria
muito bem.
danuza.leao@uol.com.br
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