São Paulo, quinta-feira, 05 de dezembro de 2002

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MENOR INFRATOR

Entidades pedem fechamento do complexo de Franco da Rocha; jovem perde o baço após suposto espancamento

OAB aponta unidade de tortura na Febem

GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL

A Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP (Ordem dos Advogados do Brasil) e entidades de defesa do menor apontam o complexo da Febem (Fundação Estadual do Bem Estar do Menor) em Franco da Rocha (Grande São Paulo) como um centro de maus-tratos aos menores infratores e pedem seu fechamento imediato.
As denúncias de espancamento coletivo, tortura e abuso sexual supostamente ocorridas nas unidades 30 e 31 do complexo de Franco da Rocha foram descritas em um relatório divulgado ontem pela comissão da OAB.
A agressão mais recente teria resultado na internação hospitalar, na semana passada, do adolescente C.R.B., 17, que teve o baço retirado. Ele teria sido espancado por funcionários da unidade 31, onde está há sete meses.
Os integrantes da comissão classificaram o estado das coisas em Franco da Rocha como uma "nova Imigrantes" -referência à unidade da Febem desativada em 1999 depois da maior rebelião de sua história, com 18 horas de conflito e quatro menores mortos.
As instalações em Franco da Rocha foram construídas para abrigar um Centro de Detenção Provisória, destinado a presos comuns, mas virou uma unidade da Febem para abrigar justamente os remanescentes da Imigrantes.
Depois da desativação em 1999, parte dos adolescentes foi distribuída nos cadeiões de Pinheiros, Santo André e no COC (Centro de Observação Criminológica), no complexo do Carandiru. Em maio de 2000, eles foram para Franco da Rocha.
"A estrutura da tortura e dos maus-tratos empregada em Franco da Rocha é a mesma adotada na Imigrantes. Podemos ter a reedição daquele fim trágico", afirmou o padre Júlio Lancelloti, da Pastoral do Menor.
O relatório da comissão da OAB nasceu de uma visita ao complexo em 11 de novembro. Segundo o documento, só a visita à ala F da unidade 31, por exemplo, constatou que 32 dos 34 menores presentes apresentavam marcas de espancamento e maus-tratos.
A agente administrativa desempregada Edna Francisco da Rocha, 37, mãe do adolescente que perdeu o baço, fez questão de dar seu depoimento ontem. "Fui informada pela Febem que meu filho estava com dor de estômago. Fui ao hospital e descobri que ele teve o baço retirado por causa das agressões", afirmou. "Meu filho me conta que já não sente mais dor de tanto apanhar na Febem."
O adolescente D.C.P., 17, que ficou cinco meses na fundação e saiu em julho, foi outro a falar. Ele ficou na unidade do Brás, na capital paulista. "Eu apanhava quase todo dia. Tinha de colocar os braços para trás e baixar a cabeça antes de levar tapas e socos", relatou.
A denúncia de abuso sexual, publicada pela Folha em 30 de outubro, também foi incluída no relatório da comissão da OAB. Segundo as entidades, um funcionário teria obrigado, em julho último, um adolescente a fazer sexo oral.
"O complexo de Franco da Rocha é um barril de pólvora, que pode explodir a qualquer momento", disse Ariel de Castro Neves, coordenador do Movimento dos Direitos Humanos e integrante da comissão da OAB.
O relatório será encaminhado ao Tribunal de Justiça, ao Ministério Público e também a entidades internacionais, como a ONU (Organização das Nações Unidas), a OEA (Organização dos Estados Americanos) e a Anistia Internacional.
A OAB também vai solicitar que a entidade faça uma ação civil pública pedindo o fechamento de Franco da Rocha.


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