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São Paulo, sexta-feira, 05 de dezembro de 2003

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OPERAÇÃO CASTELINHO

Ministério Público classificou como "emboscada" a ação da polícia paulista que resultou em 12 mortes

Promotoria denuncia 53 PMs por homicídio

ALESSANDRO SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um ano e nove meses depois da ação que ficou conhecida como "Operação Castelinho", em que 12 supostos integrantes do PCC morreram em um cerco policial no interior de São Paulo, o Ministério Público denunciou 53 PMs sob acusação de homicídio triplamente qualificado, por motivo fútil, meio cruel e emboscada.
Entre os acusados estão o coronel José Roberto Martins Marques, que na época comandava a Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), seu subcomandante, o major Augusto Fernando da Silva, mais o tenente-coronel reformado Roberto Mantovan, ex-coordenador do Gradi (Grupo de Repressão e Análise dos Delitos de Intolerância), e o oficial que chefiava o policiamento rodoviário na região, tenente-coronel Romeu Takami Mizutani.
Dos 53 denunciados, dez são oficiais da Polícia Militar. Ninguém foi afastado.
A Operação Castelinho foi deflagrada às 7h30 do dia 5 de março, na praça de pedágio da rodovia José Ermírio de Morais, região de Sorocaba (100 km da capital paulista). Cerca de 120 policiais da Rota, do COE (Comando de Operações Especiais) e do policiamento rodoviário interceptaram um ônibus e duas camionetes. Os 12 suspeitos pretendiam assaltar um avião de transporte de dinheiro no aeroporto da cidade.
Segundo a promotora Vania Maria Tuglio, a ação foi uma "armadilha" preparada pelo Gradi. O grupo de inteligência usou policiais disfarçados e detentos, recrutados em presídios, para criar a falsa informação do avião pagador e levar a quadrilha ao roubo.
Nos dias seguintes, a ação recebeu elogios do secretário da Segurança Pública do Estado, Saulo de Castro Abreu Filho, e do governador Geraldo Alckmin (PSDB). "Foi um primor de operação em termos de informação", disse Abreu Filho à Folha.
"Vendeu-se uma versão absolutamente mentirosa para a sociedade", afirma o promotor Carlos Cardoso, assessor de Direitos Humanos da Procuradoria Geral de Justiça de São Paulo.
Se condenados pelo júri popular, os policiais podem pegar de 150 a 370 anos de prisão. Os dois presos recrutados e que trabalharam para o Gradi, Marcos Massari e Gilmar Leite Siqueira, foram incluídos na acusação, que ainda precisa ser enviada à Justiça.

Versões
A denúncia de ontem é resultado de uma investigação do Ministério Público, com a Polícia Civil, que ouviu cerca de 50 testemunhas e reuniu novos laudos periciais. O primeiro inquérito, concluído pela Delegacia Seccional de Sorocaba, foi considerado "insuficiente" pela Promotoria.
Conforme a versão oficial da PM, o plano de assalto foi descoberto por meio de interceptações telefônicas. Depois é que teriam começado as infiltrações.
Segundo a promotora, porém, não há transcrição do conteúdo desses grampos. Testemunhas ouvidas pelo Ministério Público disseram que uma pessoa ainda não-identificada ligou para uma das vítimas propondo o plano do assalto e indicando os agentes do Gradi para participar do crime.
No dia da ação, suspeitos teriam sido rendidos e depois baleados por policiais, relataram testemunhas. "Dessa forma, as penas privativas de liberdade a que algumas daquelas vítimas estavam sujeitas transformaram-se, arbitrária e ilicitamente, em 12 penas capitais", diz a denúncia.
Ainda para a Promotoria, os PMs alteraram a cena do suposto confronto, recolhendo projéteis e possíveis provas, e prejudicaram a investigação. As três fitas das câmeras da Viaoeste, concessionária que administra a rodovia, desapareceram. O Ministério Público informou ter recebido da PM apenas cópias editadas.
"A grande maioria das vítimas apresenta tiros no coração e na cabeça", afirma a promotora.
O secretário e dois juízes são investigados pelo Tribunal de Justiça por causa das ações do Gradi, reveladas pela Folha a partir de julho do ano passado.

Outro lado
Em nota, a Secretaria da Segurança afirmou que a "polícia fez um cerco, com quase uma centena de policiais, exatamente para que não houvesse confronto".
A assessoria da PM não quis falar sobre a denúncia. Ontem, a Folha não localizou, em seus locais de trabalho, o ex-comandante da Rota, seu subcomandante, o ex-coordenador do Gradi e o ex-comandante da Polícia Rodoviária na região de Sorocaba.


Colaborou Caio Junqueira, da Reportagem Local


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